Soy loco por ti Tropicália

Um documentário inteligente, pouco convencional, sobre um movimento que se recusou a encaixar em gavetas.

Dificilmente um documentário “convencional”, de “cabeças falantes”, conseguiria fazer justiça ao movimento tropicalista que marcou indelevelmente a música popular brasileira - e, por extensão, a cultura popular brasileira - no curto espaço de tempo entre 1967 e 1969. A inteligência do filme de Marcelo Machado - que foi mostrado no DocLisboa 2012 e chega agora a um lançamento simultâneo em salas, DVD e video-on-demand - está, então, em trabalhar essa explosão criativa encimada por Caetano Veloso e Gilberto Gil na música ou Hélio Oiticica nas artes plásticas como se fosse um mosaico em constante desenvolvimento.


Machado registou depoimentos contemporâneos dos principais tropicalistas (Caetano, Gil, Tom Zé, Rita Lee, Rogério Duprat...) mas, durante a maior parte do filme, mantém-os apenas em voz off, sonorizando um trabalho extraordinário de pesquisa de imagens de arquivo e pós-produção visual, como um comentário “a posteriori” - o presente a olhar para o passado, a contar a história de um “sonho lindo que acabou” mas que, em vez de lamentar o seu fim, celebra o seu fervilhar. Verdadeiro happening visual onde até imagens de arquivo do Zip Zip (registadas aquando da passagem de Caetano e Gil por Lisboa em direcção ao exílio britânico) surgem, Tropicália traduz de modo notável a explosão de ideias, imagens e experiências numa “panela de pressão” que se pretendia retrato à la minuta das contradições e potencialidades de um país a encontrar ainda o seu caminho. Ao fazê-lo com esta inteligência formal, evita cair na tendência do “especial televisivo” mais ou menos esquemático; a textura das imagens deixa de ser um simples efeito visual ou uma afectação estilística para se tornar numa aproximação contemporânea a um movimento que se recusou a ficar encerrado em gavetas.

Este não é, ainda assim, um filme perfeito: fica sempre a sensação que Tropicália avança depressa demais, assume que o espectador sabe do que se está a falar, não pára o suficiente para se digerir tudo aquilo que aqui se conta, que se dirige mais aos que já sabem do que se fala aqui do que aos “não-iniciados”. É verdade, mas o que interessa é que este é o perfeito ponto de partida audiovisual para compreender o Tropicalismo.

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