O Que a Maisie Sabe

Transpor para os nossos dias uma história de Henry James não parece uma grande ideia no papel, daí que ver a dupla Scott McGehee/David Siegel acertar na mouche, com esta adaptação do romance de 1897 sobre uma menina de seis anos apanhada no meio de uma guerra surda entre os pais, seja uma pequena surpresa. A mãe é agora uma estrela rock petulante (Julianne Moore) e o pai um galerista snob (Steve Coogan) em processo de divórcio litigioso, e Maisie, mais atenta do que quase toda a gente acha, percebe que está apenas a ser usada como “moeda de troca” por adultos demasiado preocupados com as suas carreiras e mais interessados em fazerem mal ao outro do que no bem-estar da filha. Maisie, interpretada com uma maturidade quase assustadora por Onata Aprile (que tinha seis anos aquando da rodagem), não é a única vítima - também a sua ama e um dos admiradores da mãe são apanhados no turbilhão de egoísmo e privilégio dos pais, tornando O Que a Maisie Sabe numa dissecção em câmara lenta da poluição de uma relação familiar, um olhar desencantado para uma situação onde os adultos são mais infantis que as crianças. O mérito maior de McGehee e Siegel é o modo como modulam a entrega e as performances do seu excelente elenco, percebendo que não é a actualização da história que é o problema mas sim a necessidade de humanizar estas personagens e de evitar os maniqueísmos e as dicotomias fáceis para fazer justiça ao que se quer contar. Missão cumprida, O Que a Maisie Sabe torna-se numa lição da arte de bem representar no grande écrã. E um filme que merecia mais do que o lançamento meio desastrado que está a ter, exemplar de um mercado incapaz de pensar o que fazer com os filmes que vai acumulando.

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