Cartas à Directora

O stripper e o sindicalista

O presidente da Associação de Profissionais da Guarda (APG-GNR) veio a palco emitir parecer em defesa do cabo militar que desafiou o pudor e a ordem num acto de altruísmo para levantar o moral feminino, quando num bar de diversão nocturna, e de mulheres à procura da felicidade, de copos, e outros consumos fora da lei, e disse aquilo que está ao alcance da sua capacidade intelectual, e mostrou os seus atributos que a solidariedade exige para com um colega. Entre o acto praticado pelo stripper armado de glock e algemas mais robustas do que as que estão à venda nas sexyshops e as conclusões justificativas do sindicalista para o insólito espectáculo, a querer limpar os fluidos saídos do estabelecimento que serviu de estrelato provocador e libertador dos mais (im)pudicos sentidos, fico sem saber o que é mais grave. Que erro grave foi e reconhecido por todos. O sindicalista, pouco abonado de argumentos válidos, mas com a fé habitual da impunidade que faz escola naquelas fileiras, defendeu que não se deve "crucificar o guarda pelo acto irreflectido". Ora, estando o guarda apanhado em traje já muito próximo das vestes das do cristo crucificado, após se despir peça a peça da farda oficial de serviço com que saiu de casa ou do quartel, não se percebe por que é que o acto praticado é "irreflectido" e não deva ser crucificado. Depois acrescenta que conhece lindamente, bem mesmo, o "cristo" da pistola à cintura, e garantiu que se trata de "um bom profissional que até aqui não tinha infringido deveres" – ou seja, até ser apanhado. Como qualquer um de nós, até ser pela primeira vez apanhado fora das regras e dos códigos de conduta e violação dos deveres. Diz ainda, aumentando o flagelo, "que prefere o que o militar stripper fez do que ver profissionais comprometidos nas malhas da corrupção". Este discurso é um reconhecimento bem grave de que há agentes da Guarda que se movem no âmbito da corrupção, mas justifica tal mobilidade nessa área com a "crise e as penalizações que todos os dias [a GNR está] a ter". Considerando este princípio uma razão para não se ficar nu, o povo português, que há muito foi despido de tudo, tem razões de sobra para entrar na dança da ilegalidade e da corrupção sem passar factura, para se desenrascar do desconforto em que vive. Certamente que as forças da ordem e o presidente da APG-GNR, César Nogueira, compreender-nos-ão a partir de agora e não nos prenderão mais por incumprimento das normas, bem longe das luzes da ribalta, por entre as sombras do crime, que nos levam, nessas noites e em vários palcos da vida, a ter actos "irreflectidos" e a não cumprir as leis, mesmo que sejamos apanhados com a arma engatilhada apontada a olhos arregalados a observar-nos e a aplaudir ou a reprovar. Brilhante!

Joaquim A. Moura, Penafiel

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