Compromissos

Os compromissos são raros nos nossos dias. Tudo o que é afirmado pode ser desfeito no dia seguinte, ao menor pretexto.

Comecemos pela política. Uma das razões do descrédito dos nossos políticos reside justamente nas sucessivas promessas não cumpridas, ou nas afirmações pomposas depressa postas em causa. Neste aspecto, a palavra “irrevogável”, utilizada por Paulo Portas acerca da sua possível demissão, entrou hoje no anedotário nacional: quando alguém a profere em público, risos sussurrados invadem a plateia. Assim, ninguém acredita em grandes frases nem em “compromissos eleitorais”. Na campanha que se avizinha para as eleições europeias, já sabemos que pouco se vai discutir a Europa (é um tema que em Portugal, infelizmente, interessa a muito poucos) e veremos análises partidárias da situação política e promessas vagas, sem nenhuma relação com o Parlamento Europeu. Compromissos realistas de luta por novas políticas na Europa, estamos certos de que não abundarão.

Na família, a situação é semelhante. Pais e filhos emitem opiniões e prometem mudanças, mas tudo depressa é esquecido. Os castigos aos filhos de “ficar sem Internet”, agora em voga, são levantados ao menor choro ou pedido insistente dos mais novos. As promessas dos filhos de melhorar notas ou cumprir horários de estudo e de saídas à noite são postas em causa no dia seguinte, sem sobressalto significativo.

Na escola, reino da indisciplina, as sucessivas promessas de bom comportamento dos estudantes e as projectadas mudanças de atitude dos professores perante o caos de muitas aulas morrem na aula seguinte. Ninguém se responsabiliza pela mudança: os docentes agitam o argumento dos problemas familiares dos alunos, os estudantes protestam de forma desorganizada ou infantil face aos gritos e ameaças dos professores. No reino da indisciplina, não existe co-responsabilização para a mudança.

Há um território onde a falta de compromisso é ainda mais inquietante: a relação com o próprio. A auto-reflexão não abunda, a convicção escasseia, o autodomínio falta muitas vezes. Nas pessoas mais frágeis e na época de crise que vivemos, sentimentos de falta de esperança e visão negativa do futuro crescem sem parar. Todos os dias ouvimos justificar a falta de coerência de diversas acções por motivos emocionais: “passei-me”, “descontrolei-me”, “estou tão mal dos nervos que não respondo por mim”, são expressões quotidianas que escutamos a quem não consegue conhecer e manejar as suas emoções. Na psicologia barata que aparece em tantas interacções sociais, a “explicação” psicologizante menor é utilizada sem critério, servindo de desculpa para a falta de respeito e de compromisso.

Precisamos de afirmar, todos os dias, que o triunfo que possamos alcançar sobre as nossas fragilidades internas e a vitória que conseguiremos perante os desafios exteriores dependerão sempre de um plano por nós traçado face às dificuldades previsíveis, com a certeza de que também necessitaremos de uma dose de flexibilidade e intuição para fazer face ao imprevisto.

Esta é uma perspectiva que deverá estar presente em todo o acto educativo: confiança na capacidade de gerir as emoções e coragem para enfrentar os desafios do futuro.     

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