Clientes da chuva

Em Londres, as ruas mais concorridas têm longas sequências de lojas compridas com portas umas ao lado das outras. Sempre que começa a chover, entra-se numa loja e fica-se subitamente interessado no que lá vendem, continuando a fazer perguntas, a experimentar chapéus, a cheirar e a apalpar e a indicar uma coisa lá em cima que se pretende examinar mais perto.

Mal pára de chover, agradece-se, diz-se que se vai pensar nisso e sai-se para ver quantas lojas se consegue ultrapassar até ser novamente apanhado pela chuva. Chega-se a galgar sete ou oito lojas de cada vez.

Claro que os lojistas cheiram-nos à distância: são lojas caras que pagam rendas de 5 mil libras por semana. É natural que odeiem os time wasters. Nos anos 70 ainda tinham a lata de pôr cartazes nas montras: "No time wasters please". Este please é muito inglês e a frase traduzida para verdadês seria "All time wasters fuck off".

Mas também há lojistas que, sentindo-se sozinhos ou generosos, recebem bem quem faça um esforço mínimo de fingimento. Assim nos aconteceu na phantástica Pharmácia Santa Maria Novella, na Piccadilly Arcade. Para além de fragrâncias cheias de sainete (uma de tabaco toscano, outro de cubano) a loja de Londres não descura a oficina das freiras dominicanas que não pára quieta desde 1602.

Há vinagre com amoníaco para os desmaiados e amoníaco com vinagre (com uma nota de clorofórmio?) para as histéricas. Vá lá quando lá estiver, mesmo que não esteja a chover.
 

  

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