Justiça recebeu mais de 1400 candidaturas a 60 novos lugares para administradores de insolvência

Governo encaixou quase cem mil euros só com valores das inscrições. Selecção de candidatos deverá estar concluída em Abril.

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PS defende criação de incentivos à produtividade nos tribunais ADRIANO MIRANDA

Foram abertas apenas 60 vagas, mas no espaço de duas semanas o Centro de Estudos Judiciários (CEJ) recebeu mais de 1400 candidaturas ao processo de recrutamento extraordinário de administradores de insolvência lançado no início do ano. Cada inscrição custava 65 euros, pelo que, no total, foram pagos mais de 93 mil euros pelos candidatos. A selecção começa já na próxima semana, mas os eleitos só deverão ser conhecidos em Abril.

A Justiça recebeu um total de 1434 candidaturas entre 2 e 16 de Janeiro. Um número que o CEJ não considera elevado porque “há cerca de dez anos que não era feito um procedimento semelhante”, apesar de estarem previstas novas admissões à classe desde 2004. Era, por isso, “expectável que fossem apresentadas muitas candidaturas”, acrescentou fonte oficial do organismo tutelado pelo ministério de Paula Teixeira da Cruz.

Os júris escolhidos para este recrutamento extraordinário vão reunir a partir de dia 17, a próxima segunda-feira, para “apreciação das candidaturas e selecção dos candidatos” a ocupar as 60 vagas. O CEJ espera concluir este processo “durante o mês de Abril”, comunicando nessa altura a data de início do estágio obrigatório de acesso à profissão. O organismo garantiu que o elevado número de candidaturas não implicou “qualquer alteração aos prazos definidos” no regulamento do concurso.

As regras deste recrutamento, que foram conhecidas no final do ano passado, implicam o pagamento de 65 euros por inscrição, que o CEJ confirmou terem sido cobrados a todos os candidatos para “fazer face aos custos” a suportar com o processo. Isto significa que, no total, os 1434 inscritos pagaram 93.210 euro, que não serão reembolsados, mesmo que não sejam escolhidos.

Este concurso extraordinário é o último passo que falta dar na chamada reforma das insolvências, lançada em 2012 por exigência da troika e que, além de uma revisão da lei, implicou também a criação do Processo Especial de Revitalização (para empresas pré-insolventes que querem negociar as dívidas nos tribunais com vista à recuperação) e do Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial (um mecanismo gerido pelo Iapmei que foi reformulado e em que as dívidas são negociadas fora dos tribunais). Foi ainda criado um novo estatuto para os administradores de insolvência, que, entre outros, faz depender a sua remuneração do sucesso na viabilização de negócios em dificuldades financeiras.

A classe reclamava, já há muitos anos, que fossem admitidos novos profissionais, porque hoje existem apenas 300 em Portugal para acompanhar os muitos milhares de casos de insolvência que entram nos tribunais todos os anos (e a que se vieram somar os processos de revitalização, a partir de Maio de 2012). Apesar de, no ano passado, ter havido uma queda no número de empresas e particulares declarados insolventes, a fasquia continua muito elevada, tendo-se registado 18.500 falências judiciais entre Janeiro e Dezembro – ou seja, menos 0,7% face ao período homólogo.

Do lado das empresas, e depois dos consecutivos aumentos desde 2008, verificou-se um recuo de 10,1% para 5608 processos, aos quais se juntaram 12.930 insolvências de particulares (que representaram 69,7% do total). No caso das famílias em dificuldades financeiras, voltou a registar-se um aumento, embora mais ténue, de 4% face a 2012. A queda global no número de falências judiciais não pode ser dissociada do impulso a que se assistiu nas adesões ao processo de revitalização, ao qual recorreram 1527 pessoas e empresas no ano passado.

Somando todos estes processos, significa que a cada um dos 300 administradores de insolvência que hoje existem corresponderiam, em média, quase 70 casos por ano. Com o recrutamento extraordinário, a carga de trabalho diminuirá, mas não de forma drástica pelo facto de estarem assegurados apenas 60 novos lugares. A Associação Portuguesa dos Administradores Judiciais (APAJ), que representa a classe e que tem vindo a batalhar nos últimos anos pela realização deste concurso, não se opôs, porém, ao número de vagas. Num parecer pedido pelo CEJ, a entidade aconselhou, aliás, a que “a admissão de limitasse ao número considera indispensável para colmatar algum desequilíbrio decorrente da inexistência de concursos há mais de uma década”. Isto porque considera que a formação prevista ter “um carácter mais sucinto”.

De acordo com o regulamento, os candidatos escolhidos passarão primeiro pela fase de estágio, que terá uma componente teórica e uma prática, com uma duração total de três meses. No que diz respeito a esta última, será concretizada através do acompanhamento de um patrono, que terá, entre outros, o dever de “permitir que o estagiário tenha acesso a actos e peças forenses” e que “assista a diligências relacionadas com as funções de administrador judicial”. O estágio será seguido de um exame escrito.

A APAJ também tem vindo a fazer outras exigências, que ainda não obtiveram resposta, contestando nomeadamente o facto de nunca ter sido implementado o sistema de nomeação aleatória dos administradores de insolvência, como previsto na lei desde 2004. Actualmente, essa escolha continua a ser feita pelos tribunais, o que faz com que um elevado número de processos recaia sobre uma pequena fatia dos profissionais.

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