Advogado da candidatura de Moita Flores a Oeiras demite-se da CNE

Nuno Godinho de Matos integrava o CNE há mais de 17 anos como representante do PS e sai na sequência da polémica gerada por ter aceitado representar o candidato do PSD à câmara de Oeiras.

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Godinho de Matos era o porta-voz da CNE João Henriques/Arquivo

O advogado Nuno Godinho de Matos demitiu-se da Comissão Nacional de Eleições (CNE), um organismo que integrava há mais de 17 anos como representante do PS, na sequência da polémica gerada pelo facto de ter aceitado representar o candidato do PSD à câmara de Oeiras, Francisco Moita Flores, num litígio sobre a legalidade da sua candidatura. A comissão fica assim sem o seu porta-voz.

A informação foi avançada ao PÚBLICO pelo próprio Godinho de Matos, que continua, contudo, a acreditar que não existe qualquer impedimento na acumulação das duas funções. “A legalidade da candidatura de Moita Flores vai ser discutida no tribunal da comarca de Oeiras e no Tribunal Constitucional. A CNE não tem nada a ver com isto”, afirma Godinho de Matos, que na sexta-feira defendeu a mesma tese aos microfones da TSF.

Nessa altura, Godinho de Matos nada disse sobre a sua eventual demissão, que diz agora foi comunicada na sexta-feira à noite por telefone ao presidente da CNE, o juiz conselheiro Fernando Soares. “Falei com o senhor juiz conselheiro na sexta-feira à noite a comunicar-lhe a minha demissão da CNE. Na segunda-feira vou enviar-lhe uma carta formal e outra à presidente do PS a comunicar-lhe que na sequência da minha decisão o partido deixará de estar representado na CNE”, precisa o advogado, que falou este domingo ao PÚBLICO.

Godinho de Matos afirma que já tinha pensado pedir a demissão da CNE, mas que pensava fazê-lo apenas após a entrega formal da candidatura de Moita Flores a Oeiras, que tem que entrar até esta segunda-feira à tarde no tribunal local. “Como surgiram notícias antes, decidi antecipar a decisão”, refere.

Candidato do PS a Oeiras já tinha pedido afastamento de Godinho de Matos
A demissão é conhecida depois de este sábado o candidato do PS à câmara de Oeiras, Marcos Sá, ter pedido o afastamento do porta-voz da CNE. “Ele incumpriu o dever de isenção a que está obrigado”, sustentou Marcos Sá, que precisou que esta segunda-feira iria entregar uma queixa ao presidente da CNE e uma exposição à presidente da Assembleia da República.

Ainda não corre nenhuma acção em tribunal, mas um grupo de cidadãos de que faz parte Emanuel Martins, apoiante do movimento independente Isaltino, Oeiras Mais à Frente, admite vir a interpor uma providência cautelar para esclarecer a legalidade da candidatura de Moita Flores. A contestação poderá ser feita por outra via: se a candidatura for aceite pelo tribunal de Oeiras, alguém poderá impugnar essa decisão judicial.

Em causa está o facto de o antigo inspector da Polícia Judiciária ter renunciado o ano passado à presidência da câmara de Santarém, durante o seu segundo mandato no cargo, o que lhe poderia vedar a candidatura a um cargo num executivo autárquico nas eleições seguintes.

No centro desta polémica volta a estar a famosa lei da limitação de mandatos, que tem feito correr rios de tinta nomeadamente sobre se permite ou não a candidatura a outras câmaras de autarcas que já tenham cumprido três mandatos consecutivos num município. Neste caso, o artigo que está em causa é o mesmo, o um, mas no ponto três e não no um, como na situação anterior.

A lei diz que “no caso de renúncia ao mandato”, os presidentes de câmara ou de junta “não podem candidatar-se nas eleições imediatas nem nas que se realizem no quadriénio imediatamente subsequente à renúncia”. Por isso, Emanuel Martins acredita que Moita Flores não pode candidatar-se a qualquer câmara, já que renunciou a um cargo idêntico no mandato anterior.

Contudo, o PSD de Oeiras garante que Moita Flores pode concorrer à câmara de Oeiras e que “não existe qualquer dúvida” sobre a sua capacidade de elegibilidade. A lei prevê esta norma no mesmo artigo que regula a limitação de mandatos, sendo esta restrição aplicável apenas quando ocorre no terceiro mandato e não antes. “Moita Flores encontrava-se ainda no segundo mandato”, sublinha o PSD de Oeiras, num comunicado. E realça: “Existe inclusive jurisprudência sobre o assunto”, um acórdão do Tribunal Constitucional que sustenta que esse artigo “pretende prevenir apenas eventuais situações de fraude e impedir que um presidente de câmara, ao atingir o período de limitação legal dos mandatos, venha a contornar a regra que estabelece um obstáculo à sua recandidatura, através da renúncia ao mandato”.

O comunicado continua sublinhando que “todos os pareceres credíveis e independentes levam à mesma conclusão, inclusive o da Comissão Nacional de Eleições datado de 10 de Agosto de 2012”.

Jorge Miguéis, director-geral da Administração Eleitoral e membro da CNE, recusou pronunciar-se sobre a opção do colega, mas sublinhou que este não pode ser afastado já que para garantir a independência dos cargos os membros da comissão são “inamovíveis”. Miguéis confirma que o plenário da CNE se pronunciou o ano passado sobre um pedido de esclarecimento de Moita Flores, mas diz não se lembrar se Godinho de Matos participou ou não na votação.

Tem, contudo, a certeza que o porta-voz da comissão já se tinha pronunciado antes sobre aquele assunto, que realça, foi decidido pacificamente por unanimidade. “O ponto terá demorado cinco minutos. Ninguém levantou problemas, porque se considerou que a questão só fazia sentido se Moita Flores se estivesse a candidatar a Santarém e não a Oeiras”, afirma. Por outro lado, diz Miguéis, o antigo inspector da PJ renunciou durante o segundo mandato e não no terceiro, logo a restrição à candidatura não se aplica.

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