Michael

É legítimo perguntar o que é que eles andam a pôr na água na Áustria para praticamente todos os cineastas que atravessam fronteiras fazerem estes filmes glaciais, distantes, desapaixonados sobre temas-quase-tabu. Para a sua estreia, Markus Schleinzer atira-se à “banalidade do mal” de Hannah Arendt, perguntando como é que um austríaco médio, empregado de uma seguradora, à beira de uma promoção no emprego, com todos os confortos de uma vida de classe média, pode ter em casa numa cave trancada um menino que raptou para dele abusar sexualmente. E fá-lo de modo que mexe com o espectador por uma única razão: Michael pode ser um monstro, mas é também um ser humano. E onde começa um e acaba o outro? Sem escamotear o horror da premissa, Michael recusa a demagogia preto-no-branco que diaboliza o “outro” para nos lembrar, com uma neutralidade clínica que força o desconforto, que vai uma linha muito ténue entre a “normalidade” e o “desvio".

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