Papa fala da liberdade e dos encarcerados nos primeiros discursos em Cuba

Bento XVI e Raul Castro após uma missa em Santiago de Cuba
Fotogaleria
Bento XVI e Raul Castro após uma missa em Santiago de Cuba Desmond Boyland/Reuters
Peregrinos dão boas-vindas a Bento XVI
Fotogaleria
Peregrinos dão boas-vindas a Bento XVI Tony Gentile/Reuters
Bento XVI à chegada à Praça Antonio Mareo, em Santiago de Cuba
Fotogaleria
Bento XVI à chegada à Praça Antonio Mareo, em Santiago de Cuba Reuters
Papa celebra missa em Santiago de Cuba
Fotogaleria
Papa celebra missa em Santiago de Cuba Rickey Rogers/Reuters
Raul Castro recebe Bento XVI no aeroporto de Santiago de Cuba
Fotogaleria
Raul Castro recebe Bento XVI no aeroporto de Santiago de Cuba Tony Gentile/Reuters
Raul Castro aplaude Bento XVI
Fotogaleria
Raul Castro aplaude Bento XVI Alberto Pizzoli/AFP

Referências diversas à liberdade, a evocação dos “encarcerados” e das pessoas impossibilitadas de estar na missa, e apelos a que os cubanos construam “com as armas da paz, do perdão e da compreensão” uma “sociedade aberta e renovada” marcaram os primeiros dois discursos do Papa Bento XVI em Cuba.

Na sua homilia em Santiago de Cuba, perante cerca de 200 mil pessoas, entre as quais o Presidente Raul Castro, o Papa pediu que o país seja “uma sociedade melhor, mais digna do homem, que manifeste melhor a bondade de Deus”.

Antes, no discurso feito à chegada, Bento XVI aludira aos cubanos exilados pela oposição ao regime, dizendo que levava no coração “as justas aspirações e os legítimos desejos de todos os cubanos – onde quer que se encontrem –, os seus sofrimentos e alegrias, as suas preocupações e os anseios mais nobres”. E citou trabalhadores, encarcerados, pobres e necessitados.

Os últimos dias antes da visita do Papa Ratzinger ficaram marcados por uma vaga de detenções de opositores ao regime. Segundo a Comissão dos Direitos Humanos e da Reconciliação, pelo menos 150 pessoas foram presas nos dias que antecederam a chegada de Bento XVI à ilha dos irmãos Castro. As Damas de Branco, grupo de mulheres que se manifesta semanalmente em Havana desde que os filhos ou maridos foram presos em 2003, queriam uma audiência com o Papa para “Falar de direitos humanos”, mas isso não deve acontecer.

As alusões de Bento XVI aos exilados podem ter calado fundo em parte da multidão: centenas de pessoas, conta a reportagem da AFP, deslocaram-se a Cuba, em voos fretados da Florida (Estados Unidos), onde reside um milhão e meio de cubanos ou os seus descendentes. Martha Perez, de 76 anos, tinha deixado a ilha aos 26 e nunca mais voltara. “É maravilhoso poder estar aqui, diante da padroeira e do Papa. Estou muito emocionada, tão feliz de estar em Cuba, é o primeiro milagre da visita do Papa”, afirmou.

Os emigrantes cubanos chegaram segunda-feira a Santiago, com um visto especial concedido por razões religiosas. O arcebispo de Miami, Thomas Wenski, acompanhou o grupo e explicou aos jornalistas que outros grupos eram esperados terça e quarta-feira em Havana. Amanhã, Bento XVI preside a uma missa que deverá reunir de novo centenas de milhares de pessoas, na Praça da Revolução, na capital.

O bispo Wenski dizia ainda que a presença de Bento XVI em Cuba produzirá “numerosos frutos”, tal como a histórica visita do Papa João Paulo II à ilha, em Janeiro de 1998. A distensão das relações entre o regime e a hierarquia católica foi uma das consequências mais importantes dessa visita. Nessa ocasião, não houve qualquer possibilidade de cubanos emigrados nos Estados Unidos irem á ilha para ver o Papa.

Ao chegar ontem a Santiago de Cuba, depois de ter percorrido em papamóvel a distância do aeroporto à cidade, sempre saudado efusivamente por uma enorme multidão, Bento XVI presidiu à missa na Praça Antonio Maceo. O pretexto era o quarto centenário da Virgem da Caridade do Cobre, padroeira de Cuba, cujo santuário se localiza a uns 30 quilómetros da cidade e que Ratzinger visita esta tarde (hora de Lisboa), antes de partir para Havana.

Na homilia, o Papa aproveitou para recordar também os que estavam impossibilitados de participar na missa pela doença, idade “ou outras razões”.

Ratzinger, que a 16 de Abril completa 85 anos, tomou os textos bíblicos sobre o anúncio do nascimento de Jesus para falar da liberdade, num país oficialmente ateu e com regime de partido único: “É comovente ver como Deus não só respeita a liberdade humana, mas parece ter necessidade dela.”

Um pouco à frente, Bento XVI disse que viver segundo a vontade de Deus “é o caminho para encontrar” a “verdadeira identidade”. E acrescentou: “A obediência na fé é a verdadeira liberdade, a autêntica redenção, que permite unirmo-nos ao amor de Jesus no seu esforço por se conformar com a vontade” de Deus.

O Papa voltaria a fazer uma crítica implícita ao ateísmo oficial do regime ao afirmar que, “quando Deus é posto de lado, o mundo transforma-se num lugar inospitaleiro para o homem, frustrando ao mesmo tempo a verdadeira vocação da criação que é ser o espaço para a aliança” entre Deus e a humanidade.

Dirigindo-se aos católicos cubanos, Ratzinger disse-lhes: “Sei com quanto esforço, coragem e dedicação trabalhais dia a dia para que a Igreja, nas circunstâncias concretas do vosso país e neste período da história, manifeste o seu verdadeiro rosto como lugar onde Deus se aproxima dos homens e se encontra com eles.”

O Papa apelou depois a que os católicos se decidam, “sem medos nem complexos, a seguir Jesus no seu caminho para a cruz”. E pediu: “Aceitemos com paciência e fé qualquer contrariedade ou aflição, convictos de que ele, com a sua ressurreição, venceu o poder do mal, que tudo obscurece, e fez amanhecer um mundo novo, o mundo de Deus, da luz, da verdade e da alegria.”

Depois de referir a “dignidade incomparável de cada vida humana”, foi para as famílias, o Papa falou ainda da família, defendendo que “Deus confiou à família fundada no matrimónio a sublime missão de ser célula fundamental da sociedade e verdadeira Igreja doméstica”. E disse aos casais católicos: “Cuba precisa do testemunho da vossa fidelidade, da vossa unidade, da vossa capacidade de acolher a vida humana, especialmente a mais indefesa e necessitada.”

Sugerir correcção
Comentar