Parque Escolar excedeu investimento global quando o programa ia a meio

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Foto: Adriano Miranda

Relatório da Inspecção-Geral de Finanças confirma derrapagem da empresa. Ministro ia demitir ontem os seus administradores, mas estes optaram por renunciar aos cargos

Em Junho de 2011, com 181 escolas abrangidas, o programa de modernização a cargo da Parque Escolar estava a pouco mais de meio do previsto, mas aquela empresa pública já tinha ultrapassado o investimento global estimado para toda a operação, inicialmente pensada para 332 escolas. O alerta é da Inspecção-Geral de Finanças (IGF). Ontem, quatro dos cinco membros da administração da Parque Escolar renunciaram aos seus cargos.

À frente da empresa fica agora a única administradora que fora nomeada pelo actual Governo. A renúncia dos outros membros da administração foi prontamente aceite pelo ministro da Educação e Ciência, Nuno Crato, que tencionava demiti-los ontem. O PÚBLICO sabe que foi essa a razão pela qual Crato convocou ontem os administradores da Parque Escolar para uma reunião no mesmo dia. Foi nesse encontro que os administradores apresentaram a sua renúncia.

Era um desfecho esperado, mas que acabou por ser antecipado pela sucessão de acontecimentos dos últimos dias. Na terça-feira, no parlamento, Nuno Crato deu conta que os custos da intervenção da Parque Escolar por escola eram superiores em mais de 400% ao que fora inicialmente apontado. No dia seguinte, a empresa enviou um "esclarecimento" à comunicação social com números diferentes dos que foram apresentados por Crato e onde afirmava que tinha sido posto em causa o seu "bom nome".

Quando Crato foi ao Parlamento já tinha na sua posse o relatório da auditoria da IGF à Parque Escolar, que solicitara em Setembro passado. As conclusões foram ontem tornadas públicas pelo Ministério da Educação e Ciência (MEC). O investimento total por escola apurado pela IGF, com base nas intervenções realizadas até ao final de Junho de 2011, não coincide nem com as contas apresentadas quarta-feira pela Parque Escolar (12,1 milhões de euros) nem com os valores indicados na véspera por Crato (15,4 milhões). O MEC já esclareceu que o valor apontado teve na base o relatório de contas da Parque Escolar de 2010 e informações que recebeu posteriormente.

Segundo a IGF, o custo total por escola intervencionada era, há um ano, de 13, 3 milhões de euros. Estavam então concluídas obras em 95 escolas e em 86 outras prosseguiam as intervenções. Actualmente estão concluídas intervenções em 105 escolas e 70 continuam em obras. Os projectos para mais 125 foram entretanto suspensos.

A dimensão da derrapagem dos custos do programa gerido pela Parque Escolar é assim evidenciada no relatório da IGF: o custo real das obras em 181 escolas, que representam 55% daquele programa, excedeu em cinco milhões o que estava previsto para toda a operação, que deveria abranger 332 estabelecimentos com ensino secundário. O investimento global estimado, em 2008, para as intervenções em todas estas escolas era de 2,4 mil milhões de euros, cerca de três vezes mais do que custou a construção da ponte Vasco da Gama.

Mais alunos

Cerca de 70% do financiamento da Parque Escolar é proveniente de empréstimos contraídos por aquela empresa: 1150 milhões de euros contraídos junto do Banco Europeu de Investimento e do Banco de Desenvolvimento do Conselho da Europa, de que o Estado português é garante, a que se juntam, segundo a IGF, 665 milhões de euros pedidos à banca comercial.

A IGF frisa que "se não forem tomadas medidas muito concretas de redução de custos, a estimativa total do programa para 332 escolas atinge os 4,4 mil milhões de euros, ultrapassando em 84% a estimativa inicial". Em Setembro passado, o MEC já tinha dado instruções à Parque Escolar para reavaliar os projectos aprovados para as 70 escolas que estão em obras. Segundo o ministério, será possível poupar 64,5 milhões de euros, nomeadamente através da alteração de materiais e de equipamentos previstos e também pela reavaliação dos programas funcionais das escolas, nomeadamente no que respeita à projecção do número de turmas.

Esta é também uma das recomendações agora feitas pela IGF. Na sua resposta ao relatório de auditoria, a empresa justificou em parte a subida do custo das intervenções com o "aumento da área de construção por escola". Em média, este aumento foi de 70% em relação ao previsto. Segundo a Parque Escolar, tal deveu-se à necessidade de adequar as escolas ao alargamento da escolaridade obrigatória até aos 18 anos, que se tornará efectivo a partir do próximo ano lectivo; ao reforço do ensino profissional; e à generalização do ensino com turno único.

Dada a dimensão dos custos do programa, a IGF considera que o ministério deverá reponderar "as medidas de política educativa que maior impacto tiveram no aumento das áreas de intervenção por escolas", aumentando o número de turmas, reavaliando as áreas para instalações oficinais e "anulando temporariamente a política de turno único", de modo a acolher mais alunos nas escolas requalificadas.

A IGF analisou as contas da empresa e também o desenvolvimento das intervenções em quatro escolas.

Custos excessivos

Os custos com a electricidade mais do que triplicaram em muitas das escolas intervencionadas pela Parque Escolar. Na sua resposta ao relatório da auditoria levada a cabo pela Inspecção-Geral de Finanças (IGF), a empresa justificou a situação com as novas regras de eficiência energética, aprovadas em 2006.

No seu relatório, a IGF conclui, contudo, que foram também utilizadas "soluções técnicas com custo ou qualidade excessivos, face à finalidade da obra". Entre os exemplos apontados figuram a "aplicação de iluminação decorativa", "utilização exagerada de equipamentos de halogéneo", "instalação de potências eléctricas demasiado elevadas", "duplicação de sistemas móveis de audiovisuais", "dependência excessiva da ventilação mecânica", e "uso massivo de estores eléctricos".

Ao nível da construção, foram também utilizados materiais com custo excessivo. Recorreu-se a "madeiras nobres", foram utilizadas "pedras naturais nobres em instalações sanitárias", feitos "pavimentos exteriores em deck de madeira". São apenas alguns dos exemplos apontados pela IGF, que lembra ainda que se registou uma degradação rápida de vários dos materiais utilizados.

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