Ácidos e amizade: o mundo de “Adventure Time”

"Head trips" para todas as idades

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Acreditem: vale sempre a pena prestar atenção ao Cartoon Network. Com as últimas décadas povoadas por desenhos animados para adultos, a distinção entre miúdo e graúdo tem-se tornado cada vez menos clara. Se por um lado resultou em várias gerações que cresceram com programas adultos como os “Simpsons”, também deu confiança aos criadores de desenhos animados declaradamente infantis para incluírem cada vez mais referências adultas. Hoje em dia, um programa que não aposte em referências da cultura "pop" e metatextualidade é a excepção, não a regra.

Isto não é inédito (os "Looney Tunes" já o faziam nos anos 40) e muitas vezes é feito de forma descartável e preguiçosa. Mas aumenta ao menos a paleta do que um desenho animado "mainstream" pode ou não fazer. Um programa como “Adventure Time” teria sido completamente inconcebível durante a minha infância. E fiquei a perder.

Adventure Time” detalha as façanhas de dois amigos - Jake, o cão, e Finn, o humano - que passam o tempo a lutar contra monstros e a salvar princesas. Jake é um bonacheirão com um ego enorme; Finn é sensato e ocasionalmente um pouco tímido. Até aqui, nada que saia dos moldes tradicionais. Mas “Adventure Time” utiliza uma estética "Senhor dos Anéis", mas injecta uma dose forte de psicadelismo, tornando o programa bizarro e mais do que um pouco perturbador dentro do seu meio bucólico.

Para todas as idades 

A estética de “Adventure Time” remete para pontos de referência como “Where The Wild Things Are” (livro e filme), para desenhos animados dos anos 80 e para videojogos de “Super Mario” até “Katamari Damarcy”. Tem um estilo artesanal, uma sensibilidade ao mesmo tempo grotesca e gentil. Os temas de abertura e fecho de cada episódio são cantados com guitarra acústica, com uma nota de melancolia na voz. “Adventure Time”, não vale a pena negá-lo, é bastante "indie" na forma como mistura transgressão e preciosismo, experimentalismo e inocência.

Mas o interessante é que o programa funciona para todas as idades. Por muito que a "font", a remeter para o jogo “Advanced Dungeons & Dragons”, e a banda sonora com toques 8-bit puxem os cordões de "geeks" nostálgicos, as personagens funcionam como heróis apelativos para um público infantil. Putos expostos às ocasionais "trips" de ácido que pontuam o programa poder-se-ão sentir assustados, possivelmente até terão uma noite ou duas de pesadelos, mas a amizade entre o destemido rapaz e o seu divertido cão impede o programa de alienar o seu público infantil. E quanto aos adultos: "tune in, turn on and drop out."

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