Rango

É possível fazer uma comédia animada transplantando a trama do "Chinatown" de Polanski para um ambiente de "western" tradicional habitado por lagartos, tartarugas, toupeiras, roedores e outros habitantes do deserto? "Rango" é a prova que sim, mesmo que não prove que se pode fazê-lo bem. Ou, dito de outro modo: esta animação surreal é um olhar meta-referencial sobre a validade do "western" nos dias de hoje, através da história de um camaleão de estimação que um acidente de automóvel deixa à sua sorte no deserto e leva até uma cidadezinha dos "westerns" clássicos à mercê de um "barão da água".


No entanto, essa meditação intrigante - e uma série de piadas bem sacadas - esbarram numa vontade de "topa a tudo" que desequilibra violentamente o projecto. É nominalmente um filme para um público mais jovem, mas a maior parte das referências (que vão dos Monty Python à cena da cantina da "Guerra das Estrelas" original, passando por uma delirante versão "hillbilly" da Wagneriana "cavalgada das valquírias" de "Apocalypse Now") apenas serão inteligíveis aos adultos mais cinéfilos.

E a ideia de usar a "estranheza" das habituais caracterizações de Depp como base da sua personagem de camaleão é um rasgo de génio que nem o argumentista John Logan ("Gladiador", "O Aviador") nem o realizador Gore Verbinski ("Piratas das Caraíbas") aproveitam condignamente. Sobra um objecto que deu claramente imenso gozo a fazer e que está repleto de ideias engenhosas, mas que parece não saber exactamente a quem se dirige - mas que só pela vontade de fazer algo de diferente do actual rame-rame da animação merece um olhar atento.

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