Woody Allen marca a cruzinha do filme anual com uma comédia de humor tão cruel, cínico e escarninho que mesmo os ferrenhos de longa data terão alguma dificuldade em sorrir sem que a gargalhada se estrangule a seguir.

Variação doméstica sobre a matriz "Crimes e Escapadelas", traça meticulosamente a desintegração de um clã londrino a partir do momento em que o patriarca aterrorizada pela velhice pede o divórcio e se amanceba com uma prostituta bimba e a esposa traumatizada se refugia no uísque e nas videntes de vão de escada.

Allen desenha uma espiral descendente de insatisfações, traições, humilhações e más decisões que filma indiferentemente (apesar da presença de Vilmos Zsigmond na fotografia) e estrutura preguiçosamente (apesar de um final gloriosamente cínico, ainda mais cruel do que o que ficou para trás), mas fá-lo com uma crueldade e um desencanto que não lhe conhecíamos tão sádicos, como se o desespero que sempre vimos latente no seu humor já não se conseguisse esconder.

Por uma vez, o elenco feminino é constantemente soberbo (palmas a Gemma Jones, Lucy Punch e Naomi Watts) enquanto os homens literalmente andam em piloto automático. A evidência é só uma: tinha tudo para ser uma boa colheita, mas Allen precisaria de se teria empenhado mais para lá chegar.