O Nuno Pombo não vai à África do Sul

1. Como também já não foi a Rovereto (Itália), onde termina hoje o Campeonato Europeu de Tiro de Campo. Em tempo de hiper futebol há que dedicar espaço a coisas sérias e que tocam de perto os direitos das pessoas, neste caso dos atletas. E o Nuno não é uma situação única. Nas modalidades menos mediáticas, principalmente nas individuais, muitas histórias há que são reveladoras de omnipotentes federações desportivas.

2. Quem é o Nuno Pombo? É um atleta que no seu curriculum desportivo apresenta, para além das menções nacionais, sete participações em campeonatos do Mundo, quatro em campeonatos da Europa e três em Jogos Olímpicos.

O Nuno Pombo encontrava-se legitimado a participar nos referidos campeonatos europeus, à luz das normas regulamentares da Federação Portuguesa de Tiro com Arco, tendo em conta os seus resultados desportivos.

Tudo apontava para isso. Todavia, algo de surpreendente veio a acontecer a dois meses da prova europeia e o Nuno Ficou em casa.

3. Mediante um comunicado (?) a direcção da FPTA veio informar aos agentes da modalidade um novo modelo de funcionamento da “Selecção Nacional para 2010” e, simultaneamente, as normas que passaram a vigorar para a constituição da Selecção Nacional para o Campeonato Europeu de Campo 2010.

E, aí, nos métodos de selecção, acabam-se por introduzir critérios que se projectam em tempo anterior ao próprio comunicado e, dessa forma, introduziu a direcção da FPTA alguns efeitos retroactivos que sobrepõem ao que anteriormente estava estabelecido e de acordo com o qual, os atletas e outros agentes da modalidade, pautaram a sua actividade e sedimentaram as suas legítimas expectativas.

Ou seja, em alguma medida, os atletas, em face do comunicado (?) viram ser-lhes retiradas expectativas jurídicas anteriormente bem firmadas no "direito da FPTA". Duma “penada”, desrespeitou-se o passado regulamentar e impossibilitou-se, na prática, que o Nuno Pombo preenchesse os novos requisitos de participação na selecção.

4. Para que o leitor tenha uma ideia mais aproximada do que por vezes se passa nas federações desportivas, não resistimos em transcrever duas normas desse comunicado (?), que mais não é de que um verdadeiro regulamento e, dado que a FPTA titula o estatuto de utilidade pública desportiva, de um regulamento público. Isto é, o leitor deve ler as seguintes normas como se estivesse a ler um regulamento municipal ou do Governo.

5. Diz a primeira: Dúvidas e casos omissos: Quaisquer dúvidas serão esclarecidas ou interpretadas pela Direcção da FPTA a quem cabe a decisão final e definitiva sobre qualquer matéria referente a este comunicado incluindo a decisão sobre casos omissos. Em caso de manifesta necessidade a FPTA reserva‐se o direito de alterar ou cancelar o presente comunicado.

Aconselhamos uma leitura atenta do presente comunicado e em caso de qualquer dúvida, agradecemos que, atempadamente, a remetam para o email da FPTA. Ou seja, o poder regulamentar da direcção da FPTA é ilimitado, não tem balizas. É, numa palavra, manifesta e perigosamente ilegal.

6. A segunda norma, adiantamo-lo a título de curiosidade, mas também dá um sinal da forma como a FPTA vê as coisas: “Ficam impedidos de integrar a Selecção Nacional os arqueiros que não assinem os contratos voluntariamente”. Quase apetece perguntar que, caso sejam, obrigados ou sob coacção, não há problema.

7. E assim vivem os nossos atletas de mais valor a quem Laurentino Dias, lá da África do Sul, na turbulência da emoção futebolística e patriótica, lhes enviará, estou certo disso, as soluções próprias à defesa da sua dignidade como atletas, mas também, acima de tudo, como pessoas.

josemeirim@gmail.comNota

A partir de hoje e até ao final do Mundial, este espaço de opinião será interrompido, regressando em meados de Julho.

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