Casamentos gay no alto dos Himalaias

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O Governo nepalês espera levar um milhão de turistas ao país Desmond Boylan/Reuters

Às vezes em três anos percorre-se um longo caminho. Neste caso, será preciso recuar apenas até 2007 para chegar a um Nepal onde a homossexualidade era considerada crime, punível com dois anos de prisão - ao mesmo tempo que a pedofilia com meninas era ignorada. Mas agora o pequeno país dos Himalaias está a promover casamentos gay no Evereste e a tentar a sua sorte como destino turístico preferencial de casais do mesmo sexo.

A ideia é realizar os casamentos e organizar safaris de elefantes como lua-de-mel e outras actividades turísticas do género. Até já existe uma agência, a Pink Mountain, do deputado e activista nepalês dos direitos dos homossexuais Sunil Babu Pant. Foi dele a ideia de canalizar para ali um mercado que, diz, não é bem recebido nos outros países asiáticos. "A história do turismo é uma ideia óbvia, deveríamos ter pensado nisto há muito mais tempo", afirmou Pant ao "Times". "Com a publicidade adequada, poderemos trazer meio milhão por ano."

O próprio Governo nepalês está a promover a campanha para realizar casamentos entre homossexuais no cume dos Himalaias - que não terão valor legal, porque o Nepal não casa estrangeiros, salvaguarda Pant - e assim promover o turismo, que é a principal fonte de receitas do país.

Em 2009, as visitas de estrangeiros renderam aos cofres do Estado mais de 263 milhões de euros. Este ano, o Governo de Katmandu quer duplicar os turistas, para chegar ao milhão de visitantes. E a esperança é que os gay gastem mais dinheiro do que os turistas de "pé descalço" e mochila às costas que poupam nas estadias e nos restaurantes.

"Há muitos gay e lésbicas que querem um turismo aventureiro, ao ar livre e desportista. Nos outros países asiáticos que oferecem isto, ou não são bem vindos, ou são considerados criminosos", adiantou Pant ao "Times".

"Estamos a mudar completamente este país. É uma república recém-nascida e queremos mostrar esta mudança", afirmou ao jornal britânico o ministro nepalês do Turismo, Sharat Singh Bhandari.

O Nepal é um país hindu e conservador. Mas tolerante, diz Pant, "desde que não se ande nu na rua nem se faça nada de explícito".

Se o deputado usa o termo "tolerante", é porque o país mudou muito nos últimos anos. O Nepal fez a transição de uma monarquia governada por um rei com tendências absolutistas como era Gyanendra (que subiu ao trono depois de toda a família real ter sido assassinada num massacre no Palácio, em 1998). O monarca foi obrigado a abdicar em 2006, e em Maio de 2008 a monarquia foi abolida.

À espera da Constituição

Em simultâneo, os homossexuais deixaram de ser perseguidos e espancados pela polícia. E grande parte da luta pelos direitos homossexuais foi Patan quem a travou.

Cresceu no Nepal rural, onde a palavra homossexualidade era totalmente desconhecida, contou há meses à revista "Time". "Apesar de eu próprio saber [da orientação sexual], não o conseguia definir." O termo só entrou no seu vocabulário quando em 1992 viajou para a Bielorrússia, e apenas começou a ouvir falar em direitos gay no Japão, onde viveu, em 1997.

O seu regresso ao Nepal foi dedicado à luta pela igualdade. Criou a Associação Diamante Azul. Tornou-se deputado - o primeiro na Ásia assumidamente homossexual.

A decisão do Supremo, em Dezembro de 2007, de levar o Governo a criar novas leis contra a discriminação foi uma vitória. Mas falta ainda inscrevê-la na Constituição.

O casamento homossexual só será permitido pela legislação nepalesa quando a nova lei fundamental for aprovada, num último passo da transição da monarquia para uma república democrática - o que deverá acontecer no fim de Maio. Quando isso acontecer, o Nepal ter-se-á tornado no primeiro país asiático a permitir casamentos entre pessoas do mesmo sexo, e a pertencer a um grupo ainda muito restrito: Bélgica, Canadá, Holanda, Noruega, África do Sul, Espanha e Suécia.

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