Presidente checo provocou Cavaco pelo défice diante de empresários em busca de negócios

Foto
As acutilantes declarações de Václav Klaus sobre o défice nacional dominaram esta visita de Cavaco Silva Luís Filipe Catarino

E ao último dia da visita de Estado à República Checa, Cavaco Silva acabou por refutar as declarações do seu homólogo checo, Václav Klaus, que, em dois dias consecutivos, criticou o desequilíbrio das contas públicas portuguesas e chegou mesmo a questionar a falta de "nervosismo" de Portugal perante "um défice de oito por cento".

Num encontro com os jornalistas, num hotel no centro de Praga, ontem à tarde, o Presidente português ainda tentou fugir às perguntas sobre o assunto - experimentou falar sobre o índice de destruição da capital checa durante a II Guerra Mundial, por exemplo -, mas, perante a insistência dos media, acabou por replicar as afirmações que Klaus tinha feito na manhã de ontem. Diante de mais de uma centena de empresários checos e portugueses, reunidos num fórum económico organizado para promover parcerias comerciais, o Presidente checo declarou-se "surpreendido por Portugal não estar nervoso por ter um défice de oito por cento". O tom era irónico. E manteve-se: "É uma história interessante. Espero que não estejam aqui jornalistas. Não digam a ninguém que têm um défice maior do que o nosso [a previsão para este ano é de 5,3 por cento]."

Na ocasião, Cavaco não respondeu. Fê-lo mais tarde: "[Klaus] está convencido de que o mundo empresarial não gosta de défices orçamentais e que isso influencia a disponibilidade para os negócios. Poderia ter acrescentado que, de acordo com o nosso Plano de Estabilidade e Crescimento (PEC), teremos, em 2013, um défice de 2,8 por cento, um número melhor do que a República Checa prevê para o mesmo ano." E rematou prevendo que Portugal não estará então numa "situação orçamental mais deficitária do que a República Checa".

O Presidente quebrou assim um silêncio de dois dias sobre o défice público português, tema das "provocações" de Klaus. Mas logo a seguir tentou mitigar o contra-ataque, notando que não se deve "extrapolar as posições económicas e financeiras" do Presidente checo "para as relações entre Portugal e a República Checa". "Não vão por esse caminho", disse aos jornalistas, "porque não é esse o sentimento".

Já antes, Cavaco tinha ensaiado uma fuga ao confronto com Václav Klaus, dizendo que este"não se referia apenas a Portugal" quando abordou o tema do défice público. "A sua observação foi geral. Há muitos países da União Europeia com défices superiores ao de Portugal", disse, sublinhando que a aprovação do PEC serviu para "separar claramente Portugal da Grécia".

Não foram apenas as acutilantes declarações de Klaus sobre o défice nacional que dominaram esta visita de Estado à República Checa. Também o seu conhecido eurocepticismo marcou a estadia de Cavaco em Praga, com Klaus a reiterar as suas críticas ao Tratado de Lisboa e ao consequente aumento do "défice democrático".

Ontem, Cavaco Silva mostrou benevolência perante tais afirmações: "É conhecida em toda a União Europeia as posições, às vezes pouco ortodoxas, do Presidente checo. Sempre falámos de forma aberta sobre a Europa e temos posições divergentes, mas também é bom ouvir aqueles que pensam de uma maneira diferente sobre a Europa", afirmou, ressalvando, porém, que o eurocepticismo de Klaus representa o pensamento da maior parte da população checa.

Quanto ao alegado crescimento do "défice democrático", o Presidente defendeu que o Tratado de Lisboa "reduziu esse eventual défice democrático", pois "reforçou os poderes dos Parlamentos nacionais". E, de forma a sublinhar o seu distanciamento perante as ideias eurocépticas de Klaus, auto-definiu-se como "um pró-europeísta com muitos anos de caminhada".

O PÚBLICO viaja num avião fretado pela Presidência da República
Sugerir correcção
Comentar