Brasil mais perto de comissão sobre crimes da ditadura

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Lula anunciou a criação de um grupo de trabalho que formulará uma proposta de lei a ser discutida pelo Congresso em Abril Ricardo Moraes/Reuters

A proposta ainda terá de ser votada pelo Congresso, mas o passo é já uma rara iniciativa no modo como o país lida com a questão dos abusos da época do regime militar - neste período terão sido torturadas 20 mil pessoas entre um total de cerca de 50 mil detidos. Há ainda 400 pessoas que morreram ou desapareceram.

Ontem Lula anunciou a criação de um grupo de trabalho que formulará uma proposta de lei a ser discutida pelo Congresso em Abril do próximo ano, mas há divisões no Governo sobre o papel que terá a comissão - ou melhor, sobre o limite do que poderá fazer. O objectivo da comissão será "apurar e esclarecer publicamente as violações de direitos humanos".

O secretário dos Direitos Humanos, Paulo Vanucchi, defende que o sistema judicial brasileiro poderia usar as conclusões da comissão para punir os responsáveis. O ministro da Defesa, Nélson Jobim, invoca, pelo seu lado, a Lei da Amnistia, de 1979, durante o Governo do general João Baptista Figueiredo, a última figura de uma lista de governantes militares, que abriu caminho ao regresso de dissidentes ,mas ao mesmo tempo perdoou também os que torturaram e mataram em nome do regime.

O Supremo Tribunal Brasileiro está actualmente a analisar esta lei. "Caso o Supremo Tribunal entenda que os torturadores não podem ser amnistiados, aí sim teremos um ordenamento jurídico para a punição destas pessoas", disse Vannucchi ao jornal "O Globo".

Adrianna Setemy, do Grupo de Estudos da Ditadura Militar da Universidade Federal do Rio de Janeiro, comentou ao PÚBLICO, por e-mail, que há um "flagrante contraste no que diz respeito à cobrança de responsabilidades dos agentes do Estado" entre o modo como o Brasil e outros países sul-americanos lidaram com os abusos da ditadura: "Por exemplo, no Chile foi preso Manuel Contreras, chefe de polícia da ditadura comandada pelo general Pinochet. E na Argentina, foi condenado o almirante Emílio Massera, membro da Junta Militar que governou o país no período ditatorial (1976-1983)."

No Brasil os representantes da ditadura "ainda estão pulverizados pela cena política actual, ocupando, muitas vezes, papéis de destaque", diz a investigadora. Por isso, para que a comissão funcione de maneira eficaz, "seria preciso ir além das políticas de reparação e avançar no sentido de nomear, indiciar e punir os responsáveis pela tortura", defende Adrianna Setemy.

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