Morreu Alexis II, o patriarca da Igreja Ortodoxa russa

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Alexis II tinha fama de ser uma pessoa conciliadora e disciplinada Vladimir Suvorov/Reuters

Alexis II, o patriarca de Moscovo e o homem que restaurou a influência da Igreja Ortodoxa russa após a queda do regime comunista, morreu hoje, aos 79 anos."O santo patriarca faleceu na sua residência de Peredelkino (perto de Moscovo), durante a manhã", precisou o chefe do serviço de imprensa, Vladimir Viguilianski, citado pelas agências russas.

Os sinos de 600 igrejas de Moscovo começaram imediatamente a repicar, anunciando a morte do patriarca, e as televisões russas começaram imediatamente a transmitir documentários consagrados ao patriarca. O Santo Sínodo foi convocado para uma reunião de emergência, que terá lugar amanhã, durante a qual se irá nomear o sucessor interino de Alexis II.

Em conformidade com o estatuto da Igreja russa, um novo patriarca deverá ser eleito num prazo de seis meses por um concílio composto por vários tipos de religiosos e simples fiéis. O novo líder espiritual de 135 milhões de fiéis ortodoxos poderá ser, de acordo com a imprensa russa, o metropolita Kiril, de Smolensk y Kaliningrado, responsável pelo departamento do Exterior Eclesiástico da Igreja Ortodoxa Russa.

Kyril tinha, aliás, prevista uma visita a Lisboa na próxima semana – a primeira de um responsável de alto nível do Patriarcado de Moscovo. Neste momento, a Embaixada da Rússia em Lisboa, envolvida na preparação da visita, ainda não sabe se o metropolita mantém ou não a sua deslocação.

O patriarca Alexis, próximo do primeiro-ministro e ex-Presidente Vladimir Putin, contribuiu para a reunificação histórica da sua Igreja com a ortodoxia russa no estrangeiro em Maio de 2007, pondo fim a 80 anos de um cisma que datava desde a revolução bolchevique de 1917.

Durante o seu patriarcado, Alexis II teve uma influência preponderante na sociedade russa, ainda que a Constituição nacional estipule que a Rússia é um Estado composto por várias confissões religiosas, integrado por ortodoxos, muçulmanos, judeus e budistas.

Alexis II, nascido em Tartu, na Estónia, a 23 de Fevereiro de 1929, era o patriarca da Igreja Ortodoxa russa há 18 anos. Descendia de uma antiga família de nobres da zona báltica que abraçou a ortodoxia por volta do século XVIII. Eleito em 1990 para o cargo, pediu desde o início ao Governo que reintroduzisse o ensino da religião nas escolas. Durante o golpe de estado contra o último Presidente soviético, Mikhail Gorbatchov, colocou-se do lado do homem da “perestroika” e contra os golpistas, pedindo ao Exército para manter a calma, de modo a evitar um banho de sangue. Hoje, Gorbatchov manifestou-se “comovido” com a notícia da morte e afirmou “respeitar profundamente” a memória do patriarca.

Alexis II tinha fama de ser uma pessoa conciliadora e disciplinada, tendo reabilitado vários santos e mártires perseguidos pelo regime comunista. Em 2000 acabou por reabilitar religiosamente a figura do último czar russo, Nicolau II, e da sua família.

Durante a recta final do seu patriarcado deu impulso a um aproximar da sua ortodoxia à Igreja Católica – embora durante muito tempo tenha acusado os católicos de proselitismo –, apesar de se ter oposto no passado a uma viagem do falecido Papa João Paulo II à Rússia, argumentando que o Vaticano estaria a tentar promover a fé católica no país.

Sucessivos encontros entre Alexis e João Paulo II foram sendo previstos, em território neutro, mas foram sempre adiados, por oposição do patriarca russo. Só com a eleição do alemão Joseph Ratzinger para Papa – Bento XVI – Alexis começou a mostrar sinais de abertura a uma aproximação mais efectiva ao Vaticano. Numa primeira reacção à morte do religioso russo, a Santa Sé exprimiu a sua "surpresa" e a sua "dor" perante o anúncio da morte do patriarca.

No campo da ortodoxia, Alexis disputou ao patriarca de Constantinopla (actual Istambul), a primazia de honra. A Igreja Ortodoxa não tem um líder semelhante ao Papa (em rigor, deve falar-se de diferentes Igrejas Ortodoxas, consoante o país), mas o patriarca de Constantinopla sempre foi visto como um primus inter pares, por ter sido em Constantinopla que se deu a ruptura, em 1054, entre cristãos do Ocidente e do Oriente. Depois da queda do comunismo, em 1989, o patriarcado russo – que lidera a maior Igreja Ortodoxa, em número de fiéis – apareceu sempre a querer afirmar-se como o mais importante dentro da ortodoxia.

Alexis II foi acusado várias vezes de ter sido informador dos antigos serviços secretos russos, o KGB, acusação que o patriarcado de Moscovo negou sempre. O religioso reconheceu, porém, que as autoridades religiosas chegaram a alguns acordos com o governo soviético e pediu perdão e compreensão a todos aqueles a quem a cumplicidade da Igreja pudesse ter causado danos, durante uma entrevista dada em 1991.

O patriarca manifestou-se publicamente, em diversas ocasiões, contra a homossexualidade e chamou de "sacrilégio" as marchas de orgulho "gay".

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