A Dupla Face da Lei

Pergunta: como é que se têm no mesmo filme Pacino e De Niro, os dois maiores actores americanos da sua geração, pela primeira vez contracenando todo um filme um com o outro (no "Padrinho parte II" de Coppola nunca se cruzavam, no "Heat" de Mann só tinham uma cena juntos) e se deita fora esse trunfo de luxo num objecto descartável? Resposta: quando o realizador é Jon Avnet, antigo produtor reconvertido em realizador esquecível com "Mulheres do Sul" e "Íntimo e Pessoal".

A sua falta de jeito desbarata os talentos de De Niro e Pacino e deixa por explorar as pistas mais interessantes de um guião mal acabado mas estimulante assinado por Russell Gewirtz (autor do "Infiltrado" de Spike Lee). O título português, infelizmente, desvenda logo a premissa do filme - um assassino serial à solta por Nova Iorque cujas vítimas são criminosos que escaparam à justiça é na verdade um polícia frustrado pela sua impotência face à lei - e Gewirtz introduz uma série de boas pistas (desde uma investigadora forense com tendências masoquistas até uma refrescante incorrecção política nos subtextos xenófobos da história, passando pela possibilidade de o próprio herói da história ser o criminoso) numa estrutura narrativa demasiado decalcada de "Infiltrado".

Avnet consegue a proeza de ignorar as potencialidades para as reduzir a um sensacionalismo superficial paredes-meias com uma apologia do vigilantismo, polvilhado de conversa de balneário que soa mais forçada do que natural, para além de ser incapaz de sacar das suas estrelas algo mais que o piloto automático (com o "underacting" de De Niro a ganhar aos pontos ao "overacting" de Pacino).

Sidney Lumet tinha feito disto um mimo, Jon Avnet faz uma fita boa para o DVD de domingo à tarde.

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