Nuno Cardoso sócio de empresa que negoceia terrenos doados pela Câmara do Porto
Foi comprado em hasta pública pelos agora sócios de Nuno Cardoso, por três milhões de euros, depois de o primeiro licitador, que oferecera 15 milhões, ter desaparecido.
"A empresa não foi criada para esse efeito, mas obviamente que, se conseguirmos comercializar os terrenos de Arca D'Água, o faremos", disse ao PÚBLICO Nuno Cardoso, referindo que a constituição da sociedade nada tem de irregular. "Só conheci esses senhores há sete, oito meses. E decidimos fazer uma sociedade imobiliária. Conheço muita gente e agora estou nesse ramo do negócio", referiu.
Nuno Cardoso disse ainda ao PÚBLICO que o facto de a empresa ter uma sede "fantasma" também não é irregular. "As empresas são as pessoas. Não precisam de qualquer espaço", acrescentou, explicando que a morada indicada nos registos da sociedade (Centro Comercial do Campo Alegre, no Porto) não é a morada da empresa, mas sim de uma loja de Carlos Abreu. "É a loja de um dos sócios. O que é que isso tem de mal?", perguntou.
Terrenos doados pela câmaraOs terrenos de Arca D'Água deveriam servir para a construção do estádio do Salgueiros. Foram doados ao clube em 1997 pelo executivo autárquico que tinha Fernando Gomes como presidente da autarquia e Nuno Cardoso como número dois e vereador responsável pelo Urbanismo. A condição era que servissem para a "criação de um núcleo funcional de actividades desportivas e áreas destinadas a aparcamento, estação de serviço e construção".
Nessa altura, o clube de Paranhos era um dos mais importantes emblemas do Norte e a equipa de futebol principal já tinha disputado competições europeias. Carlos Abreu também já tinha estado à frente dos destinos do clube, mas fora afastado por José Linhares (que ainda responde em processos-crime por suspeita de fraude fiscal), depois de ter estado envolvido num processo em que era suspeito de gestão danosa.
Anos desastrososOs anos que se seguiram foram depois desastrosos para o Salgueiros. Afogado em dívidas, foi obrigado a desbaratar o património.
A venda dos terrenos de Arca D'Água ocorreu a 10 de Janeiro deste ano, na 8ª Vara Cível do Porto. Foram atribuídas três parcelas à FGVS (uma empresa imobiliária que tinha como sócios Carlos Abreu e Manuel Leite, agora sócios de Nuno Cardoso), terrenos esses localizados junto à Via de Cintura Interna (VCI).
Sobre aqueles terrenos estavam nessa altura registadas 14 hipotecas e penhoras, no montante de 10,3 milhões de euros.
A compra foi feita pela FGSV, em hasta pública, por três milhões. A empresa não foi a primeira licitadora, mas o terreno foi-lhe atribuído depois de o juiz perceber que o maior licitador, que tinha oferecido 15 milhões, tinha desaparecido.
A empresa em causa, com sede em Trofa, tem ainda outra semelhança à agora criada com Nuno Cardoso. A sede também é fantasma e na morada, em Trofa, indicada nos registos, não existe qualquer sociedade.
Este negócio teve outra particularidade. Quem licitou os terrenos de Arca D'Água foi efectivamente a empresa do presidente da comissão administrativa do Salgueiros, mas em Março, um mês antes do negócio se concretizar, aquele passou as quotas a outro empresário, poucos dias antes de constituir uma nova sociedade imobiliária com Nuno Cardoso.
Refira-se ainda que a venda em hasta pública foi contestada pela Liga de Clubes, que alegava deter uma hipoteca sobre os terrenos, no valor de 650 mil euros. Dizia ainda não ter sido avisada da venda judicial, mas a irregularidade alegada não foi suficiente para invalidar o negócio.
O PÚBLICO tentou, sem êxito, ouvir Carlos Abreu, um dos envolvidos nestes negócios.