Rudebox

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Dizia-se que seria o seu "álbum de dança" ou o seu "álbum rap". Especulou-se sobre os convidados. As críticas só começaram a sair no princípio da semana. Ou seja, o cenário de um grande regresso foi montado. O inglês tem novo álbum. Aquele que, provavelmente, os fãs de sempre mais dificuldades terão em aceitar. Aquele que os que nunca simpatizaram com ele talvez venham a gostar. Um disco bizarro no seu percurso, que poderá ser um enorme desastre e dizimar a sua base de apoio, ou relançar a sua carreira, fazendo-o conquistar novos públicos.

Em "Rudebox", regressou ao passado, aos anos 80, do electro. Rodeou-se de gente criativa que o pudesse estimular, como o nova-iorquino Mark Ronson. Andou a ouvir figuras contemporâneas que personificam a Inglaterra de hoje, como Lily Allen e The Streets. Revoltou-se contra a indústria da música e afirmou que estava farto de gerir expectativas, dizendo que iria fazer um álbum só para ele próprio. Foi assim que nasceu o novo disco, megalómano, como sempre. Não se percebe onde quer chegar, talvez porque chegue a muitos lados. Nunca teve um programa de acção – andou sempre aos ziguezagues – e não é agora que iria ter. Mas desta feita pressente-se que não capitulou perante os valores do mercado. Fez o que lhe peteceu. Não bastou para completar um grande disco, mas chegou para criar o seu melhor de sempre. É um disco onde não está só. Existem "samples", referências ou participações de um universo de gente. Os Pet Shop Boys, Lily Allen, Mark Ronson, Soul Mekanik, William Orbit, Joey Negro ou Stephen Duffy participam directamente. David Bowie, Madonna, The Streets, Sly & Robbie, Happy Mondays ou Kraftwerk pairam sobre as canções. E há versões de canções de Manu Chao, Human League, MyRobot Friend, Lewis Taylor ou do novo cúmplice na composição, Stephen Duffy. "Rudebox" é o poster de quarto de Robbie: homenagem a velhos e novos heróis, onde encontramos a pop da sua juventude e os sons pop mais recentes da velha Inglaterra. Entre os seus heróis de sempre estão os Pet Shop Boys e Madonna. À dupla Neil Tennant e Chris Lowe solicitou que produzissem a canção "She's Madonna" (onde canta: "no man on earth could say that he don't want her") e na sua companhia criou uma versão da canção "We're the Pet Shop Boys", um original do projecto americano de electropop My Robot Friend. De Madonna, o que se pode dizer é que "Rudebox" é o "Confessions On A Dance Floor" de Rob, um regresso à rua, aos sintetizadores, à roupa desportiva dos "B-boys" dos primórdios do electro e do hip-hop no alvor dos anos 80. No tema-título, por entre ritmos electro-funk quase o vislumbramos a arriscar uns pezinhos de "breakdance" nas ruas de Nova Iorque, enquanto canta "Ok then back to basics, grab / your shell toes and your fat laces / a little hand clap for some funk / faces and make your body move." Em "Good doctor", o produtor nova-iorquino Mark Ronson coloca-o a rimar por entre ritmos hip-hop absorvidos pela cadência do grime e do ska, inspirandose na música de Lily Allen e The Streets. A cantora que este ano se transformou em fenómeno regressa em "Bongo bong and Je ne t'aime plus", reinvenção de "King of the bongo" de Manu Chao, com alusões a Serge Gainsbourg. Em "The 80s" adopta o estilo de Mike Skinner (The Streets) e canta, nostalgicamente, em jeito de autobiografia, "things look better when they start / that's how the 80's broke my heart", para logo a seguir, em "The 90s", evocar a passagem pelos Take That, confessando que "I'm going to be famous / pick you up in a Porsche / and buy you lots of trainers / I met the others guys / one seemed lick a cock / I think it's going to be a like / New Kids On The Block." Mas as sugestões não se ficam por aqui: "The actor" podia ser uma canção electropop dos Depeche Mode; "Viva life on Mars" é uma fantasia aligeirada com alusões indirectas aos Primal Scream de "Screamadelica" e em "Keep on" quase que entrevemos Shaun Ryder dos Happy Mondays a cantar. É assim "Rudebox", balbúrdia de hip-hop, soul, ska, acid house, electrofunk ou electropop. Mas não se preocupem, parece dizer o guia Rob, no final de cada canção: tudo isto é apenas pop. É o seu álbum mais espontâneo, onde canta como anda, divertindo-se de forma exuberante. Mas não deverá ser ainda desta que conquistará o mercado americano. Ele debita palavras, ou "rappa", mas à inglesa. E, ao contrário das estrelas pop americanas da actualidade – de Justin Timberlake a Beyoncé –, nele nada conforta. Os americanos não entendem celebridades que dizem uma coisa, num momento, para de seguida, proferirem o contrário. Aliás, já enunciou – provavelmente a pensar o contrário – que não queria ser "grande" na América. Ouvindo "Rudebox" haverá mesmo admiradores a interrogar-se se ainda quererá ser "grande" nos países que sempre o celebraram. Também aqueles que nunca o suportaram se começam a questionar: e se...?

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