Relatório responsabiliza Exército russo pelo massacre de Beslan

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Familiares das vítimas acusam o Governo de estar a abafar a verdade EPA (arquivo)

As primeiras explosões que antecederam a ofensiva das forças russas contra a escola número 1 de Beslan, na Ossétia do Norte, a 3 de Setembro de 2004, podem ter sido causadas por granadas lançadas do exterior pelo próprio Exército.

Esta é a principal conclusão de um deputado do Partido Nacionalista Rodina, membro da Comissão Parlamentar de Investigação (CPI), Iouri Saveliev, que acaba de publicar um relatório independente contestando a versão avançada pelas autoridades.

A 1 de Setembro de 2004, um comando pró-tchetcheno invadiu a escola de Beslan, em plena cerimónia de regresso às aulas. Durante 52 horas, 1123 pessoas estiveram reféns dos rebeldes, que reivindicavam a retirada das tropas russas da Tchetchénia, até que duas explosões desencadearam um ataque do Exército e intensas trocas de tiros.

"As explosões não podem ser explicadas pela detonação de engenhos artesanais instalados pelos rebeldes", declarou Saveliev numa entrevista à Rádio Moscow Echo, citada pela BBC. O físico e perito em explosivos revelou que a maioria dos reféns interrogados durante a investigação aludiram a explosões em zonas do ginásio totalmente diferentes das referidas pela investigação oficial, o que o levou a concluir que "os engenhos artesanais dos rebeldes não detonaram". "Foram na verdade disparos de fora", acrescentou.

Saveliev, cujo relatório se baseia numa análise técnica dos destroços do edifício, declarou ao jornal russo Novaia Gazeta que "nenhuma das versões oficiais está provada pela ciência. [...] O desabamento do ginásio depois das primeiras explosões foi causado por lança-granadas". O investigador atribui a sua proveniência às "forças de segurança" ou a "cúmplices dos terroristas posicionados fora da escola", mas esta hipótese parece menos credível uma vez que a zona se encontrava isolada pelas autoridades.

Depois das primeiras explosões, os rebeldes "transferiram entre 300 e 310 [dos 1123] reféns que estavam no ginásio para a ala sul da escola", indica o relatório de Saveliev, salientando que a possibilidade dessa deslocação não foi tida em conta pelas tropas russas, que dispararam "tiros de armas automáticas, lança-granadas e tanques" contra a parte sul do edifício.

O documento de 700 páginas, publicado na edição on-line do Novaya Gazeta e no site pravdabeslana.ru, também alega que a polícia tchetchena tinha sido avisada três horas antes de que os rebeldes planeavam atacar a escola, mas não alertou as autoridades em Beslan. Um membro da CPI, Arkadi Baskaiev, citado pela Radio Free Europe, considera que as revelações de Saveliev "não correspondem de modo algum aos factos".

Mas dois anos após o massacre onde morreram 332 pessoas, 186 das quais crianças, além de 31 rebeldes, o relatório oficial da investigação parlamentar ainda não foi apresentado. O presidente da CPI, Alexandre Torchine, anunciou que o documento seguirá o modelo do inquérito sobre os atentados de 11 de Setembro de 2001 nos Estados Unidos e prometeu divulgá-lo no próximo mês.

As conclusões do relatório de Saveliev surgem numa altura em que aumentam a desconfiança e o cepticismo dos familiares das vítimas. "Estamos convencidos de que estes dois anos não nos conduziram em direcção à verdade sobre a tragédia, mas sim ao abafamento dessa verdade", declarou o Comité das Mães de Beslan num comunicado citado pela AFP.

Um monumento de homenagem aos membros das forças especiais mortos em acção em Beslan será inaugurado hoje no cemitério local, divulgou a agência francesa. Domingo está previsto o lançamento de mais de 300 balões brancos, em honra das vítimas.

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