Os Bravos Não Têm Descanso

Depois de numa das edições passadas do DocLisboa termos visto um belíssimo pedaço de utopia proletária - os fantasmas de Tati, Renoir e Demy no cenário de uma fábrica que estava a ser desmantelada, em "Ce Vieux Rêve qui Bouge", média-metragem -, chega agora a primeira longa daquele que é já uma das confirmações do cinema francês. Guiraudie é um caso de autodidactismo, com um imaginário popular sacudido por uma veia surrealizante que abre um filme à possibilidade de conter todos os géneros, do musical ao fantástico e ao "western" - e colocando as personagens numa vacilação eufórica, de tudo incluindo da sexualidade. O que é "Os Bravos não têm Descanso"? Muitas coisas que um texto não consegue conter. É um filme sobre a passagem da adolescência; é um filme sobre o espaço rural como património lendário. É um filme fantástico. E um musical e até um "western". Está sempre tudo entre uma coisa e outra que a excede. Há duas aldeias - uma "que está viva" e outra "que está morta"; há personagens que se recusam dormir para não morrer - em trânsito entre sonho e realidade; há uma rein-venção permanente de cenários (portas no campo que se abrem literalmente a outros mundos) e de cores. Como é possível perder este filme?

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