Invasão turca de Chipre foi há 30 anos

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As recentes tentativas da ONU para reunificar a ilha falharam Katia Christodoulou/AFP

Na madrugada de 20 de Julho de 1974, cinco dias após uma tentativa de golpe de Estado promovida por ultranacionalistas cipriotas gregos apoiados pela Junta Militar no poder em Atenas e destinado a impor a Enosis (a união de Chipre à Grécia), a Turquia invadiu Chipre.

A operação foi justificada pela necessidade de proteger a população cipriota turca (cerca de um terço dos habitantes da ilha) das perseguições infligidas pela guerrilha dos ultranacionalistas cipriotas gregos da EOKA-B. Planeada em duas fases, implicou a partilha do território e serviu para confirmar a ingerência e manipulação das grandes potências, numa região de decisiva importância estratégica.

Ao considerar Chipre como uma “causa nacional”, o então primeiro-ministro turco, Bullent Ecevit, emitiu a ordem de intervenção militar na noite de 19 de Julho, utilizando os direitos dos países “garantes” da independência de Chipre em 1960, para proteger “oficialmente” a minoria turca.

As forças militares turcas conquistam Kirénia (Girne em turco) em 22 de Julho, e nessa mesma noite Ancara aceitou a decisão do Conselho de Segurança da ONU sobre um cessar-fogo. Após esta primeira investida turca, a Junta Militar em Atenas e o “Governo” ultranacionalista cipriota grego dirigido por Nicos Sampson entram em colapso. A democracia regressava à Grécia.

Em paralelo, os ministros dos Negócios Estrangeiros das potências “garantes” da independência de Chipre (Reino Unido, Grécia e Turquia) promovem duas conferências a partir de 25 de Julho em Genebra, na sequência da decisão da ONU.

No entanto, a Turquia decide desencadear uma segunda operação militar entre 14 e 16 de Agosto, que na prática vai implicar a ocupação de 37 por cento do território e a consumação da divisão em dois sectores. 200 mil cipriotas refugiados gregos deslocam-se para Sul, enquanto algumas dezenas de milhares de cipriotas turcos seguem o caminho inverso. Foi imposta uma “linha verde” de 180 quilómetros, controlada por capacetes azuis da ONU e que até hoje divide a ilha de Leste a Oeste.

“Jogo duplo”

A “crise de Chipre”, que se arrastava na prática desde 1963, permitiu ao então secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger, e ao Presidente Richard Nixon, utilizarem uma “diplomacia dupla”, expondo uma linha política em público, enquanto secretamente adoptavam outra. E quando se intensificavam os apelos de Kissinger para a “estabilidade da frente Sudeste da NATO”.

Investigações recentes revelaram que no decurso da crise cipriota os Estados Unidos encorajaram em privado os coronéis gregos de Atenas a fomentarem um golpe de Estado em Chipre, ao mesmo tempo que forneciam uma implícita “luz verde” para a posterior invasão da Turquia. Kissinger também foi acusado de incentivar Ancara para a segunda e decisiva invasão de Agosto de 1974.

Este “jogo duplo”, num contexto de Guerra Fria e caracterizado por grandes tensões no Mediterrâneo Oriental, foi então utilizado pelos EUA em vários cenários mundiais apesar da crise interna motivada pelo desfecho do “caso Watergate”, que vai implicar a resignação de Nixon.

Em 1959, tinha sido Eisenhower, então Presidente dos EUA, a pressionar o Reino Unido para a concessão da soberania à ilha de Chipre em troca de bases militares e foi Washington quem negociou secretamente o acordo que legitimou a independência, sob os auspícios das três potências “garantes” do compromisso.

Mas já em 1964 os EUA tinham planos para a divisão de Chipre que previam uma limitada ocupação turca da ilha, e mesmo propostas concretas para obrigar as arqui-inimigas Grécia e a Turquia, membros da NATO desde 1953, a dividirem o território. E durante a ditadura dos coronéis (1967-74) reforçaram-se os laços militares entre a Junta militar de Atenas e os Estados Unidos de Richard Nixon, o que terá encorajado o general Ioannides a prosseguir as suas aventuras militares em Chipre.

Em diversas entrevistas, Henry Kissinger, também secretário de Estado do Presidente Gerald Ford, assegurou que nunca considerou o então Presidente de Chipre, o arcebispo Makarios, como o “Castro do Mediterrâneo Oriental”, e negou qualquer “estratégia” para a sua deposição. Mas admitiu recear que Makarios “conduzisse Chipre para o Bloco de Leste”. E nos planos dos golpistas cipriotas gregos e gregos incluía-se o assassínio do Presidente cipriota grego, que consegue escapar no limite, regressando à ilha apenas em finais de 1974.

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