Verão de 2003 foi o mais quente na Europa desde 1500

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O ano de 1757 registou o segundo Verão mais escaldante desde 1500 Kay Nietfeld/EPA

O Verão de 2003 na Europa foi, provavelmente, o mais quente dos últimos 500 anos, segundo um estudo de um grupo de cientistas da Universidade de Berna, na Suíça. O estudo, hoje publicado na revista "Science", faz uma análise detalhada da variação das temperaturas na Europa desde 1500 e conclui que houve um aumento significativo nas últimas décadas.

Para reconstituir o que se passou com o clima nos últimos séculos, os cientistas utilizaram, por um lado, séries de dados obtidos por métodos indirectos, como a análise dos anéis de crescimento de árvores centenárias ou de amostras de solo ou de gelo. Medições fiáveis com termómetros existem apenas para os últimos 150 anos.

Com base nisto, concluíram que os invernos europeus do século XX foram cerca 0,5 graus Celsius mais quentes do que os dos séculos anteriores, salvo em pequenos períodos em torno de 1530 e de 1730. O Inverno mais frio foi o de 1708/1709.

Para os verões, o padrão não é idêntico. A Europa passou por uma fase de temperaturas mais elevadas entre 1750 e a segunda metade do século XIX. O ano de 1757, aliás, registou o segundo Verão mais escaldante desde 1500, só vindo a ser destronado dois séculos e meio mais tarde, pela canícula de 2003. Entre estes dois picos, estão fases de mais calor e de mais frio, neste último caso mais intenso por volta da viragem para o século XX. Foi no Verão de 1902 que os termómetros estiveram mais baixos do que nunca.

O estudo chega, a partir da análise científica, a uma conclusão que todos os europeus sentiram na prática: o último Verão foi mesmo escaldante. "Levando em conta as incertezas (...), o Verão de 2003 terá sido, muito provavelmente, mais quente do que qualquer outro desde 1500", refere o artigo.

Um outro estudo científico divulgado em Janeiro indicava já que, em termos estatísticos, 2003 é um ponto completamente fora da curva. Ou seja, o que se passou na Europa - onde o calor foi tal que provocou cerca de 19 mil mortes adicionais - não pode ser explicado pelos modelos matemáticos que prevêem como o clima se está a alterar.

O trabalho agora publicado na "Science" não analisa a influência humana na evolução climática da Europa. Mas alerta que, de acordo com os cenários existentes, "um em cada dois verões serão tão ou mais quentes do que o de 2003 no final do século XXI".

Uma questão de escala

A novidade deste estudo em relação ao que já se sabe sobre o aquecimento global é a sua escala. A evolução e os cenários para as alterações climáticas têm sido seguidos de perto por um painel intergovernamental criado em 1988 pelas Nações Unidas e pela Organização Meteorológica Mundial. No seu último relatório, publicado em 2001, este painel concluiu que a temperatura média do planeta subiu 0,6 graus Celsius no século XX. A década de 1990 foi a mais quente desde metados do século XIX e a mão humana está por trás de parte do aquecimento dos últimos 50 anos.

Esta avaliação, no entanto, refere-se ao mundo como um todo. Os modelos matemáticos em que se baseia descem apenas à escala dos hemisférios. O retrato climático da Europa, traçado pela equipa da Universidade de Berna, é mais focalizado a nível regional. Além disso, o estudo analisou as temperaturas em intervalos mensais ou trimestrais, e não apenas anuais.

A nível genérico, as conclusões para a Europa são as mesmas do que para todo o planeta. "O século XX foi o mais quente desde 1500", lê-se no artigo. A análise de 500 anos de temperaturas no continente "evidencia a actual alteração climática a nível europeu".

O aumento da temperatura europeia na última década reflectiu-se, como um espelho, em Portugal. Dados do Instituto de Meteorologia indicam que, desde 1989, todos os anos - salvo 1994 - registaram temperaturas acima da média dos 30 anos anteriores. O ano mais quente foi 1997, quando os termómetros subiram 1,6 graus acima da média.

O Verão de 2003 bateu todos os recordes. No mês de Agosto, os termómetros estiveram, em média, 2,8 graus acima do normal para a época. O ano, como um todo, só não ficou para a história como o mais quente de sempre, porque houve o Inverno foi anormalmente frio. Com isto, 2003 ficou em nono lugar na lista dos anos com maiores temperaturas.

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