Cientistas portugueses lançam "site" sobre história da energia e da electricidade

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O primeiro aparecimento conhecido de iluminação pública eléctrica em Portugal foi em Lisboa, no Chiado, a 30 de Outubro de 1878 Manuel Roberto/PÚBLICO

Sabia que o telégrafo eléctrico foi introduzido em Portugal em 1855 e que, quatro anos depois, era usado para se comunicar de Lisboa com todas as capitais de distrito? Ou que o primeiro aparecimento conhecido de iluminação pública eléctrica em Portugal foi em Lisboa, no Chiado, a 30 de Outubro de 1878? Seis candeeiros Jablochkoff davam luz ao Chiado.

Informações como estas, e muito mais, encontram-se num "site" dedicado à história da energia e electricidade em Portugal - no endereço http:www.historia-energia.com -, que resulta de um projecto de investigação que envolve onze cientistas das áreas de história, sociologia e economia.

O "site" é divulgado hoje publicamente, às 18h00, na livraria Bulhosa, no Campo Grande, em Lisboa. Será apresentado pelo coordenador do projecto, o historiador Nuno Luís Madureira, do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE), em Lisboa.

Em 2001, a Fundação para a Ciência e a Tecnologia aprovou financiamento, no valor de 65 mil euros, este projecto na área da história - que se chama "Produção, distribuição e consumo de electricidade em Portugal (1890-1973)". Além do ISCTE, o projecto conta com a participação da Universidade de Évora, das faculdades de Economia e de Ciência e Tecnologia da Universidade de Lisboa, do Instituto Piaget de Viseu, Instituto Superior de Economia e Gestão, Museu de Electricidade e RDP.

Com duração de três anos, o projecto arrancou em Abril do ano passado e já então se pensava na divulgação dos resultados, fazendo um "site" com uma dupla vertente: por um lado, divulgar informação a toda a comunidade científica, disponibilizando elementos de referência para a investigação, e por outro ao grande público.

"O 'site' procura conciliar informação para especialistas e para o grande público. Possibilita a ligação entre dois universos geralmente separados. As pessoas poderão escolher o nível de profundidade", diz Nuno Luís Madureira. Além da publicação em revistas científicas e em livros, a equipa também divulgará os resultados dos seus trabalhos no "site", numa linguagem atractiva para o grande público.

Na pesquisa de sítios estrangeiros sobre história da energia e da electricidade, sobretudo norte-americanos, ingleses, franceses e canadianos, o historiador diz que a equipa não encontrou nenhum com as duas vertentes, daí a originalidade da página portuguesa.

O "site" está organizado de forma simples. Uma parte intitulada "olhares portugueses" está dividida em quatro períodos históricos: 1850-1890, 1890-1919, 1919-1944, e 1944-1961. Percorrendo os vários períodos, encontra-se um pouco da história da telegrafia em Portugal ou dos primórdios da iluminação.

Conta-se, por exemplo, que no último quartel do século XIX deu-se o surto da produção e distribuição industrial de electricidade, que se destinava à iluminação de ruas, vias públicas, fábricas, hotéis, teatros. A tracção eléctrica nos transportes urbanos, tal como os usos na transmissão e geração de força motriz nas fábricas, apareceu na década de 1890.

Há ainda olhares portugueses sobre as primeiras empresas de produção eléctrica (que, de 1919 a 1944, se centra na termoelectricidade, com grande dependência dos carvões estrangeiros) ou sobre a aposta de electrificar o país, entre 1944 e 1961, e construir centrais hidroeléctricas e uma refinaria para tratar petróleo bruto.

O "armário frigorífico" fez sensação

Outras partes do "site", também completadas com depoimentos e cronologias, dedicam-se às "empresas", à "história em sons" (aqui podem ouvir-se anúncios dos anos 50 e 60 a aparelhos eléctricos) ou à "história em imagens" - onde aparece uma factura de 1906 para pagar o gás e a electricidade. Até 1930, não há uma regra para o valor a pagar, por isso os preços podiam ser díspares em localidades pouco distantes. "Tudo depende do sítio, das horas de consumo, da estação, da remuneração dos capitais das empresas concessionárias", lê-se. Só na década de 30, os grandes concessionários a adoptam a ideia de que o montante a pagar deve depender das quantidades consumidas.

Na "história em imagens" não ficou esquecida a visita a Lisboa do físico italiano Marconi, em 1920, pois apresenta-se a página da revista "Ilustração Portugueza" que relata sua ida ao Paço de Sintra. Ou as publicidades, na década de 30, à novidade que eram os electrodomésticos. O aparelho mais publicitado foi o frigorífico ou "armário frigorífico".

As Companhias Reunidas de Gás e Electricidade, na área metropolitana de Lisboa, investiram bastante para mostrar as qualidades dos electrodomésticos e usaram um leque de meios, desde cartazes nas ruas, concursos de montras, cursos de culinária a carros com publicidade, que funcionavam como montras ambulantes.

Há ainda a secção "curiosidades", com palavras cruzadas ou um jogo de respostas de escolha múltipla, e um "glossário", onde se aprende que "briquetes" é o que se chama ao carvão preparado em aglomerados ou que Marconi foi o pai da telegrafia sem fios, conseguindo a primeira comunicação dessa forma em 1895. Além da apresentação da equipa e do projecto, há artigos científicos e documentação técnica, como um índice do consumo de energia comercial primária entre 1890 e 1982, que a equipa construiu - "uma das lacunas que este projecto já preencheu", frisa o historiador, explicando que "permite averiguar a taxa de crescimento em vários períodos na sociedade portuguesa."

De oito em oito meses, serão feitas grandes reformulações do "site". Nos planos da equipa está a internacionalização deste espaço, e para tal pretende divulgar artigos de cientistas estrangeiros. Também pretende criar uma entrada ligada ao ambiente e à ecologia e outra destinada aos mais novos, para abordar os cuidados a ter com a energia e o ambiente.

Permitir que alunos alojem páginas neste "site" e a criação de um arquivo sonoro com entrevistas a quem, nos anos 60 e 70, esteve envolvido nesta área vão ser outras novidades. Este arquivo de memória oral terá entrevistas a 27 pessoas, 12 já estão feitas. "Queremos pôr a nossa visão e a visão das pessoas envolvidas nos acontecimentos."

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