25 de Abril contado às crianças

"Capitães de Abril", ou 24 horas na vida de uma revolução, tem uma "memória afectiva" do 25 de Abril. Foi realizado por alguém, Maria de Medeiros, que, não tendo vivido a revolução directamente, sentiu-a através das vivências e relatos alheios, mas que lhe eram próximos. É, então, uma operação de resgate que se aproxima da imaginação, do sonho e da mitificação. É o que existe de caloroso no filme; é o que justifica ele abeirar-se de um registo iconográfico, e da fantasia - do musical "encantado" de Jacques Demy, nas cenas do Carmo, à iconografia romântica estabelecida com "Casablanca", na cena do embarque de Marcelo Caetano, por exemplo. Mas o afecto não garante, por si, uma forma cinematográfica, nem as várias sinalizações, ou "intuições", da cineasta. Ficam vinhetas, fica um Maia (do italiano Stefano Accorsi) cujo rosto da "pureza" é "traído" pela voz (dobrada), ficam alguns "maus da fita" (Joaquim Leitão, numa pequena participação, é irrepreensível), mas a pulsão de tragédia nunca se materializa. Nem a ingenuidade - uma espécie de "25 de Abril contado às crianças" - é consequente, já que nunca se assume o olhar da criança ao qual, no plano final, Maria de Medeiros parece querer fazer corresponder o seu filme.

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