Despedida do São Jorge reúne centenas de pessoas

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O cinema São Jorge estreou em 1950 com o filme «Red Shoes» DR

Ao contrário de outras noites, o átrio do cinema S. Jorge, em Lisboa, esteve cheio de gente ansiosa para comprar um bilhete para a última sessão do dia. Depois de ter sido anunciado o encerramento do último grande cinema da capital, em virtude da sua venda a uma sociedade imobilária, foram muitos os que se quiseram "despedir do velhinho".

"Terra - Campo de Batalha", do realizador Roger Christian, é o filme que marca o encerramento do São Jorge, estreado em 1950 com o filme "Sapatos vermelhos", fita realizada pelos britânicos Michael Powell e Emeric Pressburger. De acordo com as declarações das funcionárias da bilheteira, Maria do Carmo e Fernanda Lopes, ao PUBLICO.PT, as salas ficaram a meio da lotação, uma afluência que, dizem, "faz lembrar as boas casas de outros tempos".
Não fora o anúncio do encerramento das portas e nada teria feito com que o átrio da velha sala de cinema registasse tamanha afluência. Isso mesmo confirma uma das empregadas do bar, que defende que o "grande responsável pelo encerramento é o público porque prefere as 'caixas de fósforos' [as novas salas de cinema de pequenas dimensões dos centros comerciais]". Apesar de o fim do cinema São Jorge a lançar no desemprego, sublinha que a administração já garantiu a respectiva indemnização.
A ideia de que pouco mais restava à empresa proprietária do cinema do que a venda é partilhada por quase todos. Para Rogério Moreira, uma das pesssoas que esta noite esperava na alongada fila para as bilheteiras, "os interesses imobiliários foram determinantes". Apesar de se sentir triste, até "porque não se vislumbra uma solução para o problema", Rogério Moreira defende que a Câmara Municipal de Lisboa deveria ter um papel mais activo na defesa do cinema: "a autarquia deve olhar pela oferta cultural da cidade, por isso devia tentar manter este espaço aberto, mesmo que fosse para outra actividade cultural qualquer".

Os protestantes e os nostálgicos

Apesar da indignação de muitos - bem visível nas duas faixas colocadas no passeio em frente ao cinema, em que se podia ler: "João Soares és a vergonha da cidade", ou "Trouxa Real tira daqui a pata", numa alusão ao arquitecto Troufa Real que estará a trabalhar na remodelação do espaço - a maioria dos que hoje se deslocaram à Avenida da Liberdade quis apenas despedir-se de um dos mais históricos cinemas da capital. Foi essa a intenção de Rafael Reis, um jovem que afirmou ser um frequentador do São Jorge "desde miúdo". Uns anos depois, e na companhia da namorada, decidiu passar por lá uma última vez apenas para se "despedir do velhinho". Mesmo assim considera que o seu encerramento "é uma asneira, pois o São Jorge é algo que o Estado devia defender".Também presente no encerramento da sala de cinema esteve Miguel Portas, um dos dirigentes do Bloco de Esquerda, que aproveitou a ocasião para criticar o facto de "a Câmara de Lisboa ter prescindido de usar o seu direito de preferência na aquisição do imobiliário". "O João Soares só podia saber o que estava a fazer, até porque Troufa Real é um dos seus arquitectos mais próximos", acusou o dirigente bloquista, que se afirmou um adepto do "grande ecrã da sala de cinema, criado para o cinema espectáculo".

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