A China e uma crise de medalhas

Media chineses falam de flop no Rio de Janeiro, depois de a Grã-Bretanha ter ultrapassado a China no medalheiro.

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You Hao cai na final das paralelas. A China desiludiu na ginástica...e não só Reuters

Derrotas em desportos dominados pela China em Jogos Olímpicos anteriores deixaram o país num pouco familiar terceiro lugar no medalheiro, com alguns analistas a preverem o menor número de medalhas para China em duas décadas. Até agora, os atletas chineses fracassaram na defesa dos títulos em modalidades históricas na China, como o badminton e os saltos para a água, deixando o país atrás dos EUA (28 ouros) e da Grã-Bretanha (19 ouros) ao fim de 11 dias de competição. “Estão a brincar? O país que nunca acabou à frente da China está prestes a fazê-lo”, lia-se na segunda-feira, num tweet da Xinhua, a agência de notícias chinesa.

O tweet foi apagado, mas já nesta quarta-feira a conta de desporto da Xinhua publicava um outro tweet que dava conta da desilusão da China na ginástica. “Nenhum ouro para a China na ginástica. A TeamChina sofreu o pior flop olímpico no Rio 2016”. Na ginástica, os chineses ficaram-se pelas duas medalhas de bronze.

No final da jornada desta terça-feira, a China tinha 51 medalhas – 17 de ouro, 15 de prata e 19 de bronze –, parecendo altamente improvável que consiga chegar às 38 medalhas de ouro conquistadas há quatro anos em Londres. “Uma vez que as maiores oportunidades de ouro da China estão concentradas na primeira metade dos Jogos, vai ser difícil conseguir mais do que 25 ouros nestes Jogos Olímpicos, que será o valor mais baixo das últimas cinco edições”, escreveu o serviço de notícias chinês. A China, que enviou para o Rio a sua maior delegação num Jogos fora do país (416 atletas), conquistou 16 ouros em Atlanta 1996 e 28 em Sydney 2000. De então para cá, tinha conseguido 32 em Atenas 2004, 51 em Pequim 2008 (mais do que qualquer outro país) e 38 em Londres 2012.

No Rio de Janeiro, a desilusão começou cedo. Logo no primeiro dia, Du Li e Yi Siling, antigas campeãs olímpicas no tiro, ficaram-se pela prata e bronze, enquanto o nadador Sun Yang foi segundo nos 400m livres e falhou o apuramento para a final dos 1500m livres – tinha sido campeão olímpico em Londres nas duas provas.

Nos saltos para a água, a Grã-Bretanha pôs fim a um reinado de oito anos da China na plataforma a 3 metros – os chineses tiveram de se contentar com o bronze. E no badminton, os pares femininos e misto da China foram eliminados.

Antes dos Jogos, os responsáveis desportivos do país já tinham avisado que a equipa olímpica tinha pela frente uma miríade de factores desafiantes, incluindo o desconhecimento da América do Sul, as mudanças de regras em algumas modalidades e os “menores dividendos” dos Jogos Olímpicos de 2008. “Depois de Pequim ter sido seleccionada como cidade anfitriã em 2001, a China iniciou um plano de treino de longo prazo para os Jogos de 2008”, afirmou em Julho à Xinhua Gao Zhidan, que dirige o desporto chinês. “O plano continua, mas não de forma tão vigorosa como antes. Isso vai ser um desafio.”

Os media estatais chineses e os utilizadores da Internet também estão a fazer menos pressão sobre os atletas, que integram um sofisticado sistema de escolas desportivas, financiadas pelo Estado. Muitos comentadores dizem que apreciar o desporto, em vez da obsessão por medalhas de ouro, está a ganhar importância na China.

Como prova desta mudança nas expectativas, a nadadora Fu Yuanhui, medalha de bronze nos 100m costas, emergiu no seu país como a grande estrela da China nestes Jogos Olímpicos. Fu Yuanhui  tornou-se uma celebridade nas redes sociais, graças às suas entrevistas com declarações bem-humoradas sobre temas como rapazes e menstruação. Dez milhões de fãs assistiram a uma entrevista que ela deu via uma aplicação móvel e já foi convidada para aparecer num programa televisivo quando voltar à China. “O povo chinês fez progressos. Não precisamos de medalhas de ouro para aumentar a nossa confiança e já não somos tão duros com os nossos atletas”, escreveu um utilizador na rede Weibo, uma espécie de Twitter chinês. “O que agora procuramos é o padrão de ouro que Fu Yuanhui mostra com o seu humor e inocência.”

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