A assistência humanitária em Falluja está em risco de ruir

Cada pessoa já só recebe três litros de água potável por dia. Centenas de refugiados dormem no chão e passam os dias no calor extremo.

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Os habitantes de Falluja passaram os últimos meses cercados sem água potável. MOADH AL-DULAIMI/AFP

O súbito êxodo de dezenas de milhares de pessoas que só agora estão escapar ao domínio do grupo Estado Islâmico em Falluja está a levar ao extremo a capacidade de resposta das organizações humanitárias no terreno, que alertam para a possibilidade de em breve poder deixar de haver água potável, alimento ou material médico para todas as pessoas desalojadas.

“Imploramos que o Governo iraquiano tome as rédeas da catástrofe humanitária que se desenrola diante nós”, pedia este domingo o director do Conselho Norueguês de Refugiados (CNR) no Iraque, Nasr Muflahi, citado pela AFP. Segundo ele, as agências só conseguem dar os serviços mínimos de água e alimento e já não têm material para garantir condições sanitárias e abrigo a centenas de pessoas, que passam os dias ao sol e ao calor — as temperaturas ultrapassam regularmente os 40 graus.

As organizações que operam em Falluja já vinham alertando para a escassez de material humanitário ao longo das primeiras semanas da operação para reconquistar a cidade aos jihadistas. Mas desde que as forças iraquianas libertaram o centro da cidade e forçaram os combatentes jihadistas a bater em retirada para os bairros mais a Norte, a vaga de refugiados aumentou exponencialmente: fugiram 30 mil pessoas só nos últimos três dias.

Em Amiriyat, por exemplo, um dos mais recentes campos de refugiados ao largo de Falluja onde vivem 1800 pessoas, há apenas uma latrina para as mulheres. “Nos últimos quatro dias chegaram 400 famílias ao meu campo: não têm nada”, conta à AFP um dos responsáveis do campo, que não se quis identificar. “Temos tendas para alguns deles, mas outros, incluindo mulheres e crianças, dormem no chão. A situação é trágica.”

No sábado, aliás, o CNR já alertava para o risco de ficar sem água engarrafada nesta terça-feira. “Estamos com dificuldades em lidar com o número de pessoas que foge de Falluja, especialmente no que diz respeito à oferta de água potável”, diz Muflahi. “Cumprimos o mínimo de dar três litros diários por pessoa e não sabemos durante quanto tempos o conseguiremos aguentar.”

E isto com uma população que passou meses cercada, sem acesso a água potável e que agora sofre por isso. “Vemos entre 600 a 700 doentes todos os dias, da manhã à noite. A maioria sofre de diarreia, gripe e erupções cutâneas resultantes da água imprópria para consumo”, explicava este fim-de-semana Azeez Mousa Hamad, o director de um hospital a pouco mais de dez quilómetros de Falluja.

O primeiro-ministro iraquiano, Haider al-Abadi, prometeu dar apoio aos refugiados de Falluja, mas o seu próprio Governo está já sob grande pressão noutras zonas do país, onde mais de 3,4 milhões de pessoas estão desalojadas pelos combates contra o Estado Islâmico.  De acordo com o gabinete de protecção dos refugiados da ONU, já 84 mil pessoas fugiram de suas casas em Falluja desde que começou a ofensiva contra os jihadistas, no dia 23 de Maio.

A ONU calcula que possam estar mais 25 mil pessoas na cidade, à espera de fugir dos bairros em que o Estado Islâmico ainda não foi derrotado, é ainda muito perigoso sair de casa ou que simplesmente ainda não foram desminados pelas equipas iraquianas. Este domingo, o comando militar de Bagdad anunciou a recaptura do hospital de Falluja, que os jihadistas estavam a usar como centro de comando.

“O número avassalador de pessoas que estão a sair de Falluja atropelou a nossa capacidade de resposta para as pessoas que precisam”, argumenta Nasr Muflahi, do CNR, uma das agências mais activas nos arredores de Falluja. “O Governo iraquiano deve ter um papel de protagonista no que diz respeito a colmatar as necessidades dos civis mais vulneráveis, que suportaram meses de trauma e terror”, acrescenta. 

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