Deputado do PS acusa Conselho de Estado de entrar em matérias exclusivas do Governo

Ascenso Simões considera que reunião convocada pelo Presidente “altera o perfil tradicional” do órgão, e teme que este se transforme num “conselho de ‘homens bons’”.

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Paulo Pimenta

O deputado e membro da Comissão Política Nacional do PS Ascenso Simões fez esta quinta-feira uma dura crítica a Marcelo Rebelo de Sousa pelo formato e tema escolhidos para a primeira reunião do seu Conselho de Estado, temendo que este órgão de consulta política do Presidente da República se transforme num conselho de “homens bons” – expressão que remete para os membros da comunidade aldeã e das vilas que, na Idade Média, tinham certa relevância social e podiam participar nas listas de eleitores que escolhiam os membros das câmaras municipais, podendo votar e serem votados.

Num artigo de opinião publicado na edição diária online do jornal oficial do PS Acção Socialista, intitulado Um Conselho de Estado estranho, Ascenso Simões considera que o facto de este órgão analisar o sistema financeiro português, prevendo-se que possa “incluir uma leitura mais ampla sobre a dívida soberana”, entra em matérias “da exclusiva responsabilidade do Governo” e altera o “perfil tradicional” daquele órgão de consulta política do Presidente da República.

“Uma atitude voluntarista até pode tolerar-se quando o mais alto magistrado da Nação faz anúncios sobre visitas de Estado do primeiro-ministro” - escreve o primeiro director de campanha de António Costa nas últimas eleições legislativas, referindo-se às declarações de quarta-feira de Marcelo Rebelo de Sousa sobre o que o primeiro-ministro irá dizer na visita à Grécia da próxima segunda-feira -, “mas é menos aceitável quando intervém no escopo das competências dos restantes órgãos de soberania”.

“Ao assumir uma posição, mesmo que seja só de mera auscultação, o que o Conselho de Estado está a fazer é a consagrar um novo ente que, a não haver cuidado, se pode sobrepor ao Governo implicando-o, um conselho de “homens bons”, mas um conselho que desvirtua os fundamentos constitucionais”, escreve o antigo secretário de Estado da Administração Interna, considerando que o Conselho de Estado não deve ser “uma Casa Civil de valor reforçado”.

“No concerto constitucional o Presidente, órgão unipessoal, deve ouvir quem muito bem entender, pode consagrar uma opinião como bem lhe aprouver, mas não deve construir inovações nos circuitos de decisão, principalmente quando elas implicam na formatação constitucional das competências inalienáveis do Governo”, sublinha.

Os convites à participação do presidente do Banco Central Europeu e do Banco de Portugal são igualmente contestados por Ascenso Simões, para quem esta novidade “promove a triangulação de informação entre estas entidades e um outro órgão de soberania em matéria financeira”. Na sua opinião, “os agentes que circulam nos mercados carecem de um único caminho na decisão, de um único decisor perante cada dossier. E esse decisor, sem qualquer dúvida e sem autorização prévia, só pode ser o Governo”, sublinha.

Ascenso Simões ataca directamente Marcelo Rebelo de Sousa: “O Presidente, ao inovar nos circuitos, não ficando quieto na ‘cadeira’ que a norma e a história lhe consagram, impõe a prazo uma menor capacidade do Governo perante os mercados financeiros, as agências de notação e os investidores”.

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