O amor é lindo... e o filme é cândido e simplório

Nada em Amor é Lindo...Porque Sim! está a pensar no cinema, apenas em modelos televisivos, da telenovela aos programas de humor em sketches.

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Ingénuo e simplório em termos de ideias, pobremente televisivo em termos formais: O Amor é Lindo...

Enquanto a televisão nunca ocupou (nem sabe muito bem o que fazer com) o espaço do cinema dito “autoral”, ocupou, dir-se-ia que naturalmente, o espaço do cinema dito “popular”. É com ela, espécie de irmã rival, que o cinema com ambições comerciais está em competição, não é com os “outros” filmes. Daí que, com igual naturalidade, este cinema tenda a parecer-se com a televisão, porque é a ela que tem que roubar espectadores, não é aos filmes de Pedro Costa ou de Miguel Gomes. O Amor é Lindo...Porque Sim!, sem ser tão dramático como alguns casos recentes, é mais um exemplo disto: nada no filme está a pensar no cinema, material ou teoricamente falando, apenas em modelos televisivos, da telenovela aos programas de humor em sketches.

Em termos “performativos”, do corridinho narrativo àquele “naturalismo”, muito falso (porque na verdade é profundamente tipificado), que norteia quer os diálogos quer a representação, não há outro universo referencial. O que até é estranho no caso de Vicente Alves do Ó, realizador que nos seus filmes anteriores (Quinze Pontos na Alma e Florbela), embora com resultados modestos, mostrava perseguir alguma sofisticação cinéfila e ter a cabeça numa ideia de cinema popular à escala universal. O cinema só aparece longinquamente, como inspiração remota: aquele mundo bairrista (a zona entre Belém e o Calvário), a sua tipificação classista (os ricos e os pobres, em caricaturas especulares sempre relativamente bondosas), a sua população de fadistas e futebolistas em sucessivas ansiedades amorosas (em torno das quais gira toda a história), é o mesmo mundo dos “Pátios das Cantigas” de antanho, transposto para o tempo das “mercearias modernas” e outras coisas que tais.

Mas dito isto, há um aspecto em O Amor é Lindo… Porque Sim! que o torna quase “incriticável”: a sua dimensão de filme amador, visto corresponder também ao projecto de final de curso de uma escola de actores (com o “tempero” da presença de profissionais bem rodadas, como é sobretudo o caso de Maria Rueff e de Ana Brito e Cunha). Em parte a candura do filme – do seu argumento, dos seus diálogos, das suas personagens – explica-se por aí, e não o dizemos de maneira completamente depreciativa, porque a energia desajeitada de praticamente todos os actores (e a total falta de carisma de alguns deles) deixa espaço a alguns sorrisos e alguns momentos em que se escapa, mesmo que involuntariamente, à reprodução cem por cento certa e maquinal dos maneirismos e convenções televisivas (a cena do encontro entre a protagonista Amélia e o seu pretendente “toureiro” é um bom exemplo, com aquele tombo completamente forçado). Nessa perspectiva – a de estar, no fundo, a fazer o filme “deles”, dos jovens actores – percebe-se a lógica de “não-interferência” da direcção de Alves do Ó, e a sua preferência por campos/contracampos ou por planos fixos (alguns até razoavelmente longos), como forma de conter toda a “acção” (normalmente um diálogo) de cada cena.

É claro que o filme deixa de ser “incriticável” a partir do momento em que está em exibição comercial e se pede ao espectador que pague um bilhete. E nem o facto de não causar nenhuma especial antipatia impede que se trata de um filme ingénuo e simplório, em termos de ideias, e pobremente televisivo, em termos formais.

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