Rebeldes do Syriza formam novo partido anti-austeridade

Antigo ministro da Energia anuncia formação com 25 deputados e a agenda de saída do euro para disputar eleições antecipadas em finais de Setembro.

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Panagiotis Lafazanis junta 25 deputados que eram do Syriza e forma partido anti-austeridade Stoyan Nenov/Reuters

O que vai estar em jogo nas próximas eleições na Grécia definiu-se mais claramente com a cisão formal da Plataforma de Esquerda, a ala mais à esquerda do Syriza, que criou um novo partido, chamado Unidade Popular, com 25 deputados entre os 149 do partido de Alexis Tsipras, que se demitira na véspera convocando eleições para Setembro.

Anunciando o novo partido, o líder Panagiotis Lafazanis, antigo ministro da Energia demitido após votar contra o memorando com os credores, clarificou que a sua formação defende uma saída ordeira da Grécia do euro e o fim das políticas de austeridade. “O país não aguenta mais memorandos”, disse Lafazanis numa conferência de imprensa, citado pela Reuters. “Ou acabamos com os memorandos, ou eles acabam com a Grécia e o povo grego.”

O que está em jogo nestas eleições não é o mesmo que esteve em Janeiro, quando o Syriza chegou ao poder, argumenta num artigo no Politico o jornalista do diário grego Kathimerini Yannis Palaiologos.

Na altura, a liderança do país era disputada entre um partido que defendia as medidas de austeridade (Nova Democracia, no poder) e outro que as desafiava e prometia lutar contra elas. Oito meses depois, os partidos que têm hipótese real de vencer apoiam as medidas de austeridade.

Sinal disso são as reacções de Bruxelas e outras capitais. A Comissão Europeia acha que a votação poderá ser um passo para um apoio alargado às reformas necessárias para que a Grécia receba o terceiro empréstimo de 85 mil milhões (a primeira tranche de 25 mil milhões chegou esta semana). O líder do Eurogrupo (que junta os ministros das Finanças da zona euro) Jeroen Dijsselbloem disse que está confiante de que a Grécia manterá os seus compromissos após as eleições.

O facto de a eleição ser em breve – mesmo que os dois segundos partidos do Parlamento usem os três dias que a Constituição lhes dá para tentarem formar um governo alternativo, demorando um pouco mais – dá uma enorme vantagem a Tsipras. Apesar de o novo partido anti-austeridade ter já uma quase estrutura no "guarda-chuva" do Syriza, esta não é independente. Vai demorar até encontrar espaços físicos, listas, até mesmo um logotipo.«

Quanto à oposição está num estado lastimoso. O líder da Nova Democracia, Evangelos Meimarakis, tentou mostrar sentido de Estado e, criticando a opção de ir a eleições, lançou-se numa tentativa de contacto a outros partidos para formar Governo. A mera sugestão de que consideraria, eventualmente, contactar o partido neonazi Aurora Dourada teve grande repercussão negativa.

O Pasok (partido socialista) e sua nova líder, Fofi Gennimata, praticamente desapareceram. Olhando para estes partidos, vê-se outra vantagem de Tsipras: não é de uma poderosa família política nem está ligado a partidos manchados por décadas de má gestão e corrupção.

Outro partido semelhante é o pró-europeu To Potami (O Rio), que apesar disso não tem conseguido descolar do terceiro/quarto lugar, taco a taco com o neonazi Aurora Dourada.

Não há uma figura vista como capaz de liderar o país para além do primeiro-ministro demissionário. Ainda que muitos gregos lamentem o duro acordo com os credores, consideram-no como um mal menor. E mesmo que achem que as negociações poderiam ter seguido outro caminho, viram em Tsipras um líder que defendeu os seus interesses e enfrentou forças mais poderosas.

Cansaço de eleições
Os gregos estão, sim, cansados de eleições. Muitos fizeram piadas após o anúncio, dizendo que a Grécia é o berço da democracia, por isso tem de a praticar frequentemente, ou sugerindo que a data das eleições devia ser decidida por referendo.

Apesar de todas estas condições favoráveis, nem tudo será simples para Tsipras. As últimas sondagens (que davam vantagem ao Syriza e grande popularidade a Tsipras) não podem ser lidas como grande indicação, porque foram feitas já há quase um mês. E em mais um mês que falta até ao voto, muito pode ainda mudar.

Além disso, Tsipras tem defendido o acordo com os credores como algo que lhe foi imposto, a última hipótese antes de uma saída do euro, e não como a melhor solução. Ir a votos com este mote poderá não ser muito motivador. O líder do Syriza tentará acenar com a perspectiva de alívio da dívida, que vai ser discutido após a primeira avaliação do programa, em Outubro.

Caso nenhum partido da oposição consiga formar Governo, o que é uma quase certeza, um executivo interino ficará no poder até à votação, chefiado pela presidente do Supremo, Vasiliki Thanou, crítica do plano de austeridade. A inacção legislativa que se espera antes das eleições dificultará avanços e poderá significar custos a curto prazo na concretização das medidas do acordo. Essas dificuldades terão efeitos na avaliação dos credores e, por consequência, poderão repercutir-se na discussão da dívida.

O risco de Tsipras foi calculado, sublinha a correspondente do jornal britânico The Guardian Helena Smith. Mas uma vez posto em marcha o caminho das eleições, nota a jornalista, a política grega tem provado que não é possível descartar surpresas.

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