Astérix e Obélix Contra César

Conseguirão os consumidores da BD de Uderzo e Goscinny engolir este pastelão de "gags" repetitivos que é "Astérix e Obélix Contra César"? É a maior produção francesa de sempre, com o cabotinismo de Gérard Dépardieu na pança de Obélix e um patético Roberto Benigni, no seu pior registo de palhaço pobre.

Parecia já ter passado a folia de adaptações de banda desenhada a cinema, depois de "Superman" (1978) e respectivas sequelas, de "Flash Gordon" (1980), da série "Batman" (iniciada em 1989), num visível esgotamento representativo, e sobretudo após a experiência visualmente diversificante de "Dick Tracy" (1990). A tentativa da versão em imagem real de "Os 101 Dálmatas" fizera, inclusive, pensar numa mudança de lógica, passando a concentrar agulhas no património da animação fílmica como matriz para novas experiências de sobrevivência de um imaginário em crise. Eis senão quando se anuncia, no âmbito europeu e numa cinematografia de muito menor poderio industrial, a francesa, uma superprodução ressuscitando uma das jóias da coroa da BD francófona, o inefável Astérix e os seus companheiros gauleses. Todo o projecto cheirava a regresso a um passado longínquo, a um contexto que radicava mais num certo tipo de cómico francês, do que na tradição da transposição do desenho para a imagem em movimento, com regras de género relativamente delimitadas. Quando se aborda a pré-história do filme não constitui, portanto, surpresa saber que Louis de Funès, a insuportável vedeta do "burlesco" francês dos anos 60 e 70, teria manifestado interesse em interpretar Astérix: vêm dele, dos seus tiques, das caretas e disparates com que disfarçava uma total falta de talento, a linhagem que desemboca em "Astérix e Obélix Contra César". Só que pelo caminho encontramos incontornáveis marcos miliários do equívoco que a indústria francesa ergueu em torno do seu cinema de exportação. Falamos de "Os Visitantes" (já nem vale a pena mencionar a sequela, "Os Visitantes II"), megasucesso no hexágono francês, mas tratado fora dele como merecia: um dos mais estúpidos e inúteis arremedos de comicidade, recheado de alarvidades sem nome, assinado por Claude Zidi e com, entre outros, Christian Clavier. Não por acaso, Zidi e Clavier (o inacreditável Astérix) fazem o "raccord" com o filme de que nos ocupamos, o que nos coloca, desde logo, no reino da asneira. O que é, pois, "Astérix e Obélix Contra César"? Uma rasante ilustração de Uderzo e Goscinny, concebida para atrasados mentais. Tudo tem que aparecer bem explicado e sublinhado a traço grosso, com a agravante de as "cauções artísticas", as prestações de Gérard Dépardieu e de Roberto Benigni, ainda por cima recém-oscarizado, mais não fazerem do que baixar a bitola das respectivas carreiras. Parece que Dépardieu desejava há muito entrar no bojo de Obélix e quanto a Benigni bastava o triste espectáculo da entrega dos Óscares para levar a temer as horrorosas palhaçadas com que "compõe" o seu Detritus. Que dizer do resto, dos pobrezinhos efeitos especiais, dos cenários patéticos (se o objectivo era citar o "peplum", tirem daí o sentido), de um trabalho fotográfico eficaz, mas submetido, de propósito, à mediocridade geral? Uma coisa tem que afirmar-se: nada destoa para se atingir o grau zero da arte das imagens. Conseguirão, porém, os consumidores da banda desenhada (e as pobres crianças a quem se vai vender prioritariamente esta absurda inanidade) engolir este pastelão chatíssimo e de "gags" repetitivos, previsíveis e denunciados? Da parte do pobre crítico (crítico sofre!) o pior que se pode dizer é que este "Astérix e Obélix Contra César" faz pena. A irritação só vem depois.

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