Coligação e PS fazem jogos de (im)paciência

Presidente do PS protesta que Passos tarda a apresentar o novo executivo e Governo, que a maioria de esquerda no Parlamento promete chumbar. Líder do CDS contra-ataca, dizendo que o PS "tem sede de poder". Esquerda e direita tentam moldar o tempo aos seus interesses.

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Passos e Costa encontraram-se duas vezes depois das eleições legislativas Daniel Rocha

As negociações entre o PS e os dois partidos à sua esquerda, PCP e BE, prosseguem, discretamente, entre as equipas de negociadores, no Parlamento. Ainda não há um documento final, assinado pelos três partidos, mas existe uma plataforma comum que permite a António Costa contar com a aprovação do Orçamento para 2016. Muito centrada na política de rendimentos, a negociação permite, também, criar condições para que os próximos orçamentos obtenham o voto favorável da maioria dos deputados. “Impedir que as medidas de austeridade incidam sobre salários e pensões” é, para simplificar, o objectivo desse acordo.

Mas a iniciativa, agora, está do lado da coligação PSD/CDS-PP. É Pedro Passos Coelho que tem de formar Governo, apresentá-lo ao Presidente da República e, de seguida, mostrar o seu programa no Parlamento. Aí, como já foi assumido por PS, PCP e BE, será muito provavelmente rejeitado. O que implica a demissão do primeiro-ministro.

Isso ajuda a explicar este “jogo de paciência” que Passos e Costa estão a jogar e a ausência de novidades, quer de um lado quer do outro. O actual primeiro-ministro indigitado dá sinais de não querer acelerar o processo de formação do seu Governo. Passos prefere manter a pressão sobre o PS, deixando que as notícias e os comentários sobre as linhas gerais do acordo da esquerda desgastem o seu adversário – por não haver  ainda nenhum acordo oficial e por serem divulgadas medidas que podem implicar aumento da despesa –, em vez de se sujeitar o seu próprio programa a um chumbo quase garantido pela maioria de esquerda no Parlamento.

António Costa, por seu lado, tem repetido que não quer que aconteça a este acordo com os partidos de esquerda o que aconteceu ao seu programa eleitoral para as legislativas de 4 de Outubro: estar no centro das críticas. Para o PS, o momento certo para apresentar o eventual acordo que está a negociar com Jerónimo de Sousa e Catarina Martins é depois de ser conhecido o programa do Governo de Passos Coelho.

“Demora” incompreensível
E exaspera-se por esse processo parecer não avançar. Numa nota enviada à agência Lusa nesta segunda-feira, o presidente do PS, Carlos César, considera incompreensível  “a demora” do primeiro-ministro indigitado Passos Coelho em "apresentar a composição do Governo para tomar posse e apressar a apreciação do programa do governo. Temos que passar adiante”, enfatiza Carlos César que, na quarta-feira, deverá ser eleito pelos outros deputados socialistas para suceder a Ferro Rodrigues nas funções de líder parlamentar socialista.

O presidente do PS considera que, na actual conjuntura, o país “não pode perder tanto tempo e não deve ficar com um Governo que não governa e que só quer concluir uns quantos negócios à pressa, e consolidar por toda a parte e à socapa centenas de nomeações para controlo partidário futuro da administração" - uma acusação refutada por Marques Guedes, ministro da Presidência, que garantiu que o Governo não teve "qualquer tipo de intervenção e responsabilidade" na nomeação de cargos intermédios na Administração Pública que resultam, sobretudo, de concursos publicos realizados no primeiro semestre. 

Carlos César também apontou o dedo ao silêncio do Presidente da República, Cavaco Silva, em relação ao que (não) se está a passar. “Nem se compreende que o Presidente da República o permita”, lê-se. “Para uns efeitos o Presidente da República fala a mais e para outros a menos. Assim não”, acrescenta.

"Sede de poder"
A iniciativa de Carlos César foi logo criticada pelo líder do CDS-PP, Paulo Portas, que acusou o presidente do PS de revelar “sede de poder”. “O Presidente da República indigitou o doutor Pedro Passos Coelho, que eu sabia, quinta-feira à noite da passada semana. Estamos, portanto, no segundo dia útil. Essa afirmação do presidente do PS denota, de forma muito nítida, ambição de poder, sede de poder, fome de poder. Estamos no segundo dia útil”, afirmou Paulo Portas aos jornalistas, à margem de uma reunião com a UGT.

A escolha de Carlos César para líder parlamentar foi justificada por António Costa durante a reunião que fez na semana passada, no Parlamento, com os novos deputados do PS, com a visão que apresentou sobre os próximos quatro anos. Costa explicou que via o líder parlamentar como o “n.º 2 do Governo” devido à “forte incidência parlamentar” que um eventual governo por si liderado teria de ter. Nesse ambiente, concretizou António Costa, o líder da bancada teria de ter uma “função completamente diferente” da dos mandatos anteriores, muito mais focado em negociações com as outras forças políticas representadas no Parlamento.

Do lado do PSD, o deputado social-democrata Luís Montenegro decidiu recandidatar-se à liderança do grupo parlamentar e já transmitiu essa decisão a Passos Coelho e aos deputados da sua bancada, que el egemo líder nesta terça-feira.

Também num comunicado enviado à Lusa, Luís Montenegro escreve que nos últimos dias foi “instado por vários deputados a dar continuidade ao trabalho feito nos últimos quatro anos e meio”, mantendo-se à frente da bancada do PSD neste “momento parlamentar mais complexo”.

“Reclamaremos de todos os grupos parlamentares o mesmo sentido de compromisso e abertura que imporemos a nós próprios e não calaremos a nossa voz na denúncia de qualquer ataque aos valores e princípios da democracia de Abril”, garante. Com N.S.L. e Lusa

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