Universidade do Algarve tem projecto para aproveitar energia das marés

Falta garantir financiamento para instalar protótipo de produção de electricidade, semelhante ao que está a ser testado na Escócia, na barra de Faro/Olhão.

Foto
O protótipo que irá entrar em testes DR

A ria Formosa foi o local escolhido para testar um protótipo de produção de electricidade, aproveitando a força produzida pelo encher e o vazar das marés. O equipamento, desenvolvido por uma empresa escocesa, destina-se a iluminar, numa primeira fase, a comunidade piscatória da ilha da Culatra, com cerca de 750 habitantes. Mas ainda falta assegurar o financiamento comunitário para que o processo possa avançar.

A transferência da tecnologia para Portugal irá resultar de uma parceria entre a Universidade do Algarve (Ualg) e a Ocean Flow Energy – a empresa escocesa que está a concluir o processo para comercializar a energia marinha no Reino Unido. A Escócia, diz André Pacheco, do Centro de Investigação Marinha e Ambiente (CIMA), “tem por objectivo tornar-se energeticamente independente só com a energia marinha”. Esta sexta-feira, no auditório da Ualg, num fórum dedicado à economia do mar, o investigador apresenta um estudo sobre a “viabilidade de produção da energia das marés”.

Portugal já leva mais de duas décadas de percurso feito para incluir as energias renováveis marinhas na estratégia da economia do mar. Porém, os projectos têm andado ao  sabor das ondas das politicas governamentais, sem grandes resultados práticos. Um marco, nesta área, foi a inauguração do parque da Aguçadoura, ao largo da Póvoa do Varzim, há sete  anos. Na altura, o Governo chegou a anunciar que estava na posição de ser o “primeiro país do mundo” a produzir electricidade, em escala pré-comercial, a partir da energia das ondas. A falta de investimento deixou o projecto a “boiar” num mar de incertezas.   

Mas já nos anos 90, os Açores tinham inaugurado, na ilha do Pico, uma central experimental de energia das ondas. “Fala-se tanto em economia do mar – mas não há, por exemplo, uma aposta grande no desenvolvimento de novas tecnologias marinhas”, observa André Pacheco, lembrando o “pioneirismo” do catedrático António Falcão a nível internacional. “Todo o esforço é um esforço académico”, conclui.

O investigador da Universidade do Algarve, de 36 anos, nascido no Porto, fez o doutoramento em hidrodinâmica e transporte sedimentar. Depois, a partir do estudou que desenvolveu na ria Formosa, decidiu aplicar-se a fundo na descoberta do potencial económico que representará a força das marés. “Temos condições para trazer para Portugal a indústria das renováveis marinhas”, enfatiza, lembrando que a “ria Formosa tem tantas condições como a Escócia para produzir electricidade”. A amplitude da maré, no sitíto onde será testado o protótipo da Ocean Flow Energy, é de 2,8 metros; no Algarve anda à volta dos 2,5 metros.

A diferença, comenta, estará no investimento público e privado que se pretende fazer. Para que a investigação não “morra na praia”, o Centro de Ciências do Mar (CCMar) da Ualg concorreu a um projecto europeu (Programa Oceanera), no valor de um milhão de euros, em parceria com duas empresas escocesas – Ocean Flow Energy e Orion Energy Center. O protótipo a instalar na ria Formosa produz energia através de um sistema de turbinas que são accionadas em função dos fluxos das marés por uma engrenagem semelhante a uma caixa de velocidades automática de um automóvel. Em terra, fica instalada uma unidade de controlo que recebe toda a informação.

Mas a produção de energia das marés não será cara? “Sim, de inicio, o custo pode ser considerado elevado, mas também a eólica, quando apareceu, afastava os investidores, agora está em expansão”, lembra André Pacheco.  A produção em série dos equipamentos, enfatiza, vem alterar as regras do mercado. A Ocean Flow Energy, com quem tem estado a trabalhar, “contou com financiamento privado, mas também uma aposta forte do Governo" escocês. De resto, foi o impulso dos capitais públicos que permitiu saltar da fase experimental para a aplicação prática.

André Pacheco, no ano passado, esteve a trabalhar por quatro vezes na Escocia, a acompanhar os testes finais do equipamento: “Estão reunidas as condições para colocar o Algarve no mapa das energias renováveis marinhas”, conclui. A este propósito volta a recordar o esforço de António Falcão (catedrático jubilado do Instituto Superior Técnico) para criar uma central-piloto europeia, na ilha do Pico, Açores, em 1999, com o objectivo de demonstrar a viabilidade da energia das ondas numa pequena ilha. “Um visionário”, comenta o jovem investigador da Ualg, confidenciando que há, três anos, quando se encontraram no Porto, reteve a mensagem que o veterano académico lhe deixou: “Continue. Na altura, toda a gente me chamava maluquinho… “.

Sugerir correcção
Comentar