Nova cimeira em Minsk para evitar “espiral dramática” da guerra na Ucrânia

Putin avisa que só se encontrará quarta-feira com os líderes da Ucrânia, França e Alemanha se até lá houver entendimento sobre questões em aberto. Merkel reúne-se nesta segunda-feira com Obama

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Merkel e Hollande têm-se desdobrado em iniciativas diplomáticas

É a nova data limite da esperança para chegar a um acordo que trave a escalada da guerra no Leste da Ucrânia. Após uma “longa conferência telefónica”, em que terão sido feitos alguns progressos, os líderes da Ucrânia, Rússia, França e Alemanha concordaram encontra-se quarta-feira em Minsk. Mas o Presidente russo foi rápido a temperar qualquer leitura optimista que pudesse ser feita, ao anunciar que só irá à Bielorrússia “se até lá tiver sido possível chegar a acordo sobre um certo número de pontos que foram intensamente discutidos nos últimos dias”.

A diplomacia continua a ser feita em contra-relógio, perante a consciência de que a cada minuto que passa é mais difícil travar a engrenagem da guerra. “Estamos muito preocupados com os combates intensos em Debaltseve [importante nó ferroviário a nordeste de Donetsk] e em Mariupol [na costa sudeste], bem como com as informações na imprensa sobre a entrada de novas colunas russas” na região, admitiu o porta-voz do Departamento de Estado norte-americano, dizendo temer que a violência “possa minar os esforços diplomáticos em curso”.

Um balanço reunido pela AFP revela que, entre a tarde de sábado e a manhã domingo, 24 pessoas foram mortas na região, metade dos quais civis. Uma jornalista da agência francesa em Donetsk, a grande cidade do Leste que os separatistas pró-russos controlam, conta que durante toda a noite se ouviram disparos contínuos de artilharia vindos das zonas em redor. Um porta-voz militar ucraniano, citado pela Reuters, disse que os separatistas pró-russos estão a fazer sucessivas tentativas para furar as linhas defensivas que o Exército montou a fim de evitar a tomada de Debaltseve – o que acontecer permitirá aos rebeldes ligar Donetsk a Lugansk, o seu outro grande bastião na região.

Milhares de civis continuam a fugir da região e, neste domingo, o ministro da Defesa francês, Jean-Yves Le Drian, disse não ter dúvidas que se falhar a iniciativa diplomática lançada quinta-feira pelo Presidente François Hollande e a chanceler alemã, Angela Merkel, estará aberto o caminho para “uma espiral dramática” da violência. “É uma questão de horas ou de dias. Se estas negociações entrarem num impasse, temo o pior”, afirmou.

A boa notícia é que a porta do diálogo não foi ainda fechada e há uma agenda carregada de encontros para os próximos dias. Depois da conversa telefónica com Putin, Hollande e o Presidente ucraniano, Petro Poroshenko, Merkel partiu para Washington onde, nesta segunda-feira, será recebida na Casa Branca por Barack Obama.

Até agora, o Presidente norte-americano tem-se mantido reticente em responder aos pedidos de ajuda militar feitos por Kiev, mas os avanços feitos nas últimas semanas pelos separatistas servem de argumento aos que defendem que o Exército ucraniano tem de receber um apoio equivalente ao que dizem está ser oferecido por Moscovo aos rebeldes. “Os ucranianos estão a ser massacrados e nós a mandamos-lhes cobertores e refeições. Os cobertores de nada servem contra os tanques russos”, lamentou o senador republicano John McCain, na conferência de segurança de Munique, onde na véspera Merkel se opôs abertamente ao envio de armas, argumentando que de pouco serviriam face às remessas “ilimitadas” de material bélico russo que estão a chegar à frente de combates e iria internacionalizar em definitivo o conflito.

O secretário de Estado norte-americano assegurou, no entanto, que os ocidentais estão “absolutamente, positivamente e inequivocamente unidos e vão permanecer unidos” face aos acontecimentos na Ucrânia, afirmando que as divergências que se ouviram em Munique são “mais tácticas do que estratégicas”. Ainda assim, John Kerry deu a entender que o envio de armas continua em cima da mesa, ao afirmar que “quanto mais tempo [demorar uma solução política] mais os EUA serão forçados a aumentar os custos exigidos à Rússia e aos seus peões”.

Face à rapidez com que se tornou letra-morta o acordo celebrado na capital bielorrussa – na origem de um cessar-fogo nunca integralmente respeitado –, o desafio de Paris e Berlim não é apenas o de conseguir travar a escalada militar, mas garantir que um eventual entendimento será aplicado. “Não queremos a paz no papel, mas a paz no terreno”, disse o chefe da diplomacia francesa, Laurent Fabius. Para isso, o plano que for levado a Minsk terá de conter cedências que Kiev esteja disposta a aceitar e garantias que satisfaçam as exigências de Moscovo, que se assume como porta-voz dos separatistas.

Em entrevista à televisão France 2, no sábado à noite, Hollande revelou que o documento em cima da mesa prevê uma linha de cessar-fogo correspondente à actual frente de combates (reconhecendo na prática os avanços feitos pelos separatistas desde os acordos de Minsk) e uma zona desmilitarizada com uma largura de “50 a 70 km” ao longo daquele traçado. Prevê também “uma maior autonomia” para as regiões russófonas. No entanto, adiantam fontes próximas do Presidente francês, continua a não haver acordo sobre o estatuto exacto que será atribuído às regiões sob controlo dos separatistas, como e quando será retirado o armamento pesado da zona e sobre o controlo da fronteira entre a Rússia e a Ucrânia – o acordo de Minsk previa a colocação de observadores da OSCE ao longo dos 250 km de separação, mas a organização diz que os rebeldes continuam a dificultar o seu acesso à zona.

Representantes dos quatro países vão estar nesta segunda-feira em Berlim para limar arestas e assegurar que a cimeira de Minsk se concretizará, adiantou o comunicado divulgado pelo Governo alemão após a conversa telefónica de domingo. “Estamos longe de ter encontrado uma solução”, admitiu o chefe da diplomacia alemã, Frank-Walter Steinmeier, mas “seria irresponsável não aproveitarmos o que poderá bem ser uma das últimas oportunidades para resolver o conflito”.

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