Três casos que prescreveram e um que vai pelo mesmo caminho

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Pedro Cunha/Arquivo

Hemofílicos
Na década de 80, 137 hemofílicos foram infectados com o vírus da sida depois de lhes ter sido administrado sangue contaminado em hospitais públicos. A adjudicação daqueles lotes ocorreu em Janeiro de 1986, meses depois de a Associação Portuguesa de Hemofílicos ter avisado, pela primeira vez, o Ministério da Saúde para aquele perigo, depois de saber de uma recomendação da Organização Mundial de Saúde na qual se chamava a atenção para a necessidade de garantir a não contaminação dos produtos de plasma. Dez anos depois dos factos, a ministra da Saúde de então, Leonor Beleza, foi acusada de, conscientemente, ter importado e propagado o sangue contaminado. Mais dez pessoas foram acusadas no processo. A ministra alegou sempre inocência, e o caso prescreveu ao fim de 18 anos, sem nunca ter chegado a julgamento.

Aquaparque
Em Julho de 1993, duas crianças de 9 anos, Frederico Duarte e Cristina Caldas, morreram afogadas nas tubagens de uma piscina do Aquaparque, um parque aquático em Lisboa. No ano seguinte, o Ministério Público acusou a administração do parque de homicídio por negligência pela morte das duas crianças, mas em finais de 1999 o Tribunal Criminal de Lisboa declara que o processo-crime prescreveu. O Estado foi condenado a pagar 600 mil euros no processo cível por omissão de legislação, no caso a falta de normas que garantissem as condições de segurança dos parques aquáticos. O ministro da Justiça de então, António Costa, recorreu da decisão. Nove anos depois da morte das duas crianças, a ministra Celeste Cardona aceita um acordo extrajudicial e paga uma indemnização aos familiares das crianças.

Isaltino Morais
Isaltino Morais, ex-presidente da Câmara Municipal de Oeiras, está preso. Mas a pena que cumpre poderia ser bem maior não fosse a invalidação de parte da sua condenação e posterior prescrição de um crime de corrupção. Já depois de uma primeira condenação, que puniu um alegado suborno de 20 mil euros por parte de um promotor imobiliário para licenciar projectos, o crime prescreveu. Em Agosto de 2009, o Tribunal de Sintra condenara-o por um crime de corrupção passiva para acto ilícito, a três anos e sete meses de prisão, mas também por três crimes de fraude fiscal, branqueamento e abuso de poder. O cúmulo jurídico foi fixado em sete anos, mas a Relação de Lisboa reduzi-lo-ia para dois, revogando o abuso de poder e ordenando a separação de processos e repetição do julgamento da corrupção, que acabou por prescrever.

Submarinos
Os eventuais crimes de de corrupção cometidos no negócio dos submarinos podiam ter prescrito em Novembro do ano passado, se não tivessem sido constituídos arguidos neste caso no passado Verão. O prazo de prescrição em casos de corrupção é de dez anos sobre a prática dos factos ilícitos, mas este é interrompido e começa a correr de novo com a constituição de arguido. Com um limite: mais metade do prazo (cinco anos) descontadas eventuais suspensões do prazo. A investigação, iniciada em Agosto de 2006, pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal ainda corre risco de vir a prescrever se houver uma acusação. É que, neste caso, os visados poderão pedir a instrução, só após a qual se decidirá se vão ou não a julgamento. E as audiências podem prolongar-se. E pode haver recursos, muitos recursos...

Processos em risco de prescrição

O BPN e o Banco Insular
Os advogados do ex-fundador do Banco Português de Negócios (BPN), Oliveira Costa, já avançaram com o pedido de prescrição no processo de contra-ordenação instaurado pelo Banco de Portugal devido à ocultação da ligação entre o grupo liderado pelo banqueiro e o Banco Insular. Oliveira Costa e mais 16 arguidos foram multados em 9,9 milhões de euros por prestação de informação falsa e falsificação da contabilidade do BPN, entre 2002 e 2007. São acusados de terem ocultado ao Banco de Portugal o relacionamento entre a Sociedade Lusa de Negócios (antiga dona do BPN) e o BPN Cayman, o BPN IFI, sediado em Cabo Verde e o Banco Insular. O julgamento, iniciado em 2012, corre no Tribunal da Concorrência, em Santarém e não há ainda uma decisão sobre o pedido de Oliveira Costa e de outros arguidos.

Multa a João Rendeiro
Uma outra contra-ordenação aplicada pelo Banco de Portugal também corre o risco de prescrição. Neste caso o beneficiário pode ser João Rendeiro, fundador do Banco Privado Português (BPP), multado pelo supervisor bancário em quatro milhões por infracções cometidas na gestão do banco, nomeadamente a ocultação de contabilidade. Os advogados de Rendeiro alegam que as irregularidades que levaram à aplicação da contra-ordenação já estão prescritas porque o banqueiro deixou de ter funções executivas na instituição de crédito em 2005, tendo já passado mais de oito anos (prazo de prescrição) sobre os factos. Mas a questão promete controversia já que a multa aplicada refere-se a factos cometidos pelo gestor entre 2002 e 2008, ano em que o banqueiro deixou o BPP e o Estado interveio a pedido de Rendeiro.

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