Reguladores estão sem estatutos há dois meses por atraso do Governo

Diplomas deveriam ter entrado em vigor em Novembro. Demora está a causar constrangimentos na organização destas entidades.

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A CMVM, liderada por Carlos Tavares, é um dos reguladores abrangidos pela nova lei-quadro Miguel Manso

Depois da controvérsia inicial que gerou, a lei-quadro dos reguladores volta a provocar polémica, pelo facto de o Governo estar dois meses atrasado na publicação dos novos estatutos destas entidades. O prazo para a sua entrada em vigor terminou no final de Novembro, mas os supervisores continuam na indefinição, o que está a resultar em constrangimentos na organização e no planeamento.

Depois da controvérsia inicial que gerou, a lei-quadro dos reguladores volta a provocar polémica, pelo facto de o Governo estar dois meses atrasado na publicação dos novos estatutos destas entidades. O prazo para a sua entrada em vigor terminou no final de Novembro, mas os supervisores continuam na indefinição, o que está a resultar em constrangimentos na organização e no planeamento.
 
O diploma, que decorreu de uma exigência inscrita no memorando de entendimento assinado com a troika, foi publicada em Diário da República a 28 de Agosto de 2013. No documento, ficou definido que a adaptação dos estatutos teria de ficar concluída “no prazo de 90 dias”. Deste período, o primeiro mês foi destinado à preparação do lado dos supervisores, já que estes tinham até ao final de Setembro para enviar propostas de adaptação ao Governo.

Este prazo foi cumprido, tendo-se iniciado a partir daí trocas de informação e reuniões entre o executivo e cada uma das nove entidades reguladoras visadas. No entanto, ao que o PÚBLICO apurou, desde o final do ano estas interacções pararam e os supervisores continuam sem novos estatutos, apesar de deles dependerem alterações substanciais na forma como se organizam e actuam na regulação dos diferentes sectores.

Há, por exemplo, supervisores que deverão ver as suas competências reforçadas com a adaptação à lei-quadro. E que, perante este atraso, começaram a preparar-se para mudanças na estrutura que ainda não sabem se vão realmente concretizar-se. Ao mesmo tempo, não sabem se conseguirão dar resposta a esse reforço com a actual estrutura de pessoal ou se terão de pedir uma autorização ao Ministério das Finanças para recrutar mais trabalhadores, visto que o Orçamento do Estado para 2014 manteve a proibição de novas contratações sem aval da tutela de Maria Luís Albuquerque.

A demora do Governo está também a provocar constrangimentos ao nível das relações laborais. É que a lei-quadro das entidades reguladoras determina que a todos os funcionários passe a ser aplicado o regime de contrato individual de trabalho, quando hoje há muitas situações em que vigora o contrato de trabalho em funções públicas. Só esta alteração vai obrigar a um conjunto de procedimentos em termos de recursos humanos que será necessário preparar antecipadamente, como é o caso do pagamento do subsídio de férias.

Neste momento, os funcionários com contrato de trabalho em funções públicas estão a receber o 14º mês de uma vez só e aos restantes foi dada a possibilidade de diluírem metade ao longo do ano, seguindo as regras adoptadas desde 2013 no sector privado. Com a adopção dos novos estatutos, todos os trabalhadores passarão a ter direito a escolher entre uma modalidade ou outra, sendo que o subsídio de Natal terá sempre de ser pago em duodécimos, por imposição do Orçamento do Estado.

A actual indefinição também está a ter reflexos em questões mais institucionais, já que há reguladores que, com a entrada em vigor da lei-quadro, vão mudar de designação, como acontecerá com o Instituto Nacional da Aviação Civil (INAC), que passará a Autoridade Nacional da Aviação Civil, e do ICP–Autoridade Nacional de Comunicações (ANACOM), que perderá a primeira sigla. Esta mudança obrigará à revisão do estacionário e de todas as plataformas de comunicação destas entidades, como os sites, estando já a ser preparada.

Governo promete estatutos "em breve"
O PÚBLICO contactou as diferentes entidades reguladoras abrangidas pela lei e confirmou a ausência dos novos estatutos. A Comissão do Mercado de Valores Mobiliários respondeu que a proposta enviada no prazo de 30 dias previsto no diploma “ainda está em análise pelo Governo”. Já o INAC referiu que a proposta que remeteu está a ser “analisada e discutida nos fora apropriados”. Também a Autoridade da Concorrência (AdC) afirmou que “entregou a proposta, discutiu-a com o ministério da tutela, cabendo agora ao Governo a aprovação dos estatutos”. E a Entidade Reguladora da Saúde (ERS) explicou que, tal como a lei-quadro estabelece, vai manter “em vigor os actuais estatutos” até que os novos sejam aprovados.

Dentro do Governo, foi criado um grupo de trabalho ministerial para acompanhar este tema que, de acordo com o Ministério da Economia, “reuniu regularmente até ao final de 2013”. A tutela de António Pires de Lima, que tem sob sua alçada quatro dos reguladores visados, admitiu um “prolongamento dos trabalhos” deste comité pelo facto de adaptação à lei-quadro se ter traduzido num processo “complexo e moroso, que exigiu ajustes significativos”, acrescentando que esta consequência também adveio do facto de ter “promovido uma participação das entidades reguladoras (…) muitas vezes em prejuízo do prazo de que dispunha”.

O ministério referiu ainda como justificação o facto de estar em causa “uma medida decorrente do memorando de entendimento”, tendo sido necessário “que o Governo se certificasse junto da troika que era dado pleno cumprimento” aos seus pressupostos. A tutela garantiu, porém, que “todos os estatutos se encontram em fase final de adaptação”, assegurando ainda que “os primeiros projectos de decreto-lei já começaram a dar entrada em circuito legislativo, prevendo-se (…) que sejam aprovados a muito breve trecho”.

Por sua vez, o Ministério das Finanças assumiu que o processo “sofreu algum atraso”, justificando tal facto com a existência de “matérias que deverão ser acauteladas de modo uniforme, embora reconhecendo as especificidades de cada um dos reguladores, nomeadamente no que se refere às regras de transição relativas ao regime de pessoal”. A tutela de Maria Luís Albuquerque disse esperar que “brevemente os estatutos sejam adoptados”. Já o Ministério da Saúde, que tutela um dos reguladores abrangidos (a Entidade Reguladora da Saúde), explicou que “foi necessário verificar se a proposta apresentada” pelo supervisor “se encontrava conforme” a lei-quadro e sujeitar estas matérias à “confirmação pelos credores internacionais”.

A adaptação dos estatutos das entidades reguladoras à nova lei-quadro ainda terá de ser aprovada em Conselho de Ministros, promulgada e publicada em Diário da República. Estão em causa nove entidades supervisoras. A tutela de Paulo Macedo garantiu que este processo estará concluído “a breve prazo”.
 
 

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