TAP perdoa 20 milhões à Venezuela para recuperar dinheiro retido

Apesar da benesse, companhia ainda tem por recuperar 100 milhões. Em Angola, pediu ajuda ao BIC para repatriar capitais e, na Guiné Bissau, perdeu dois milhões com a liquidação de um banco.

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Fernando Pinto, presidente da TAP, tem lidado com instabilidade em alguns mercados internacionais Miguel Manso

A TAP fez um desconto de 20,5 milhões de euros à Venezuela para conseguir recuperar uma parte do dinheiro retido. A informação, que consta no relatório e contas de 2014, mostra que, à semelhança de outras empresas do sector, a companhia foi obrigada a perdoar uma parte da dívida nas negociações com o Governo de Nicolás Maduro. Ainda assim, a transportadora aérea nacional continua a ter cerca de 100 milhões de euros presos no país.

No documento, a TAP refere que no ano passado fez uma “reavaliação do desconto concedido no âmbito do repatriamento de capitais sobre as vendas de 2013, na sequência das negociações efectuadas com as autoridades venezuelanas, no montante de 20,5 milhões de euros”. A companhia não explica que montante já conseguiu recuperar desde que o problema começou a surgir, no início de 2014, mas a verba retida ronda agora os 100 milhões. Ao que o PÚBLICO apurou, em meados do ano passado, conseguiu recuperar cerca de 18 milhões, mas não se sabe se o valor aumentou entretanto.

Em 2014, houve notícias na imprensa internacional sobre companhias de aviação que aceitaram perdoar parte da dívida para receber o dinheiro retido na Venezuela. A TAP nunca confirmou que integrava este grupo, mas a verdade é que foi uma das poucas que conseguiu repatriar capitais naquela altura, após um acordo que envolveu cerca de uma dezena de transportadoras aéreas. O conflito entre a indústria da aviação e o Governo de Nicolás Maduro deve-se à situação económica do país e à imposição de câmbios mais gravosos face ao dólar.

No relatório e contas, a companhia de aviação liderada por Fernando Pinto explica que, dos 100,9 milhões que estavam por recuperar a 31 de Dezembro do ano passado, a grande maioria (77 milhões) dizia respeito a vendas realizadas no país entre Maio e Dezembro de 2013. Os restantes 24 milhões referiam-se a receitas geradas entre Janeiro e Maio de 2014.

Apesar de ainda decorrerem negociações com vista à resolução do problema, a companhia admite que “um desfecho menos favorável desta situação poderá vir a originar, no futuro, a necessidade de algum ajustamento no valor das disponibilidades localizadas na Venezuela e, consequentemente, afectar negativamente o resultado das operações e a posição financeira da empresa”.

O PÚBLICO pediu à TAP uma actualização dos valores retidos no país, bem como uma confirmação de que foi obrigada a perdoar parte da dívida, mas não obteve resposta até ao fecho desta edição.

A situação da Venezuela não é, porém, a única. Embora com uma dimensão menor, a companhia também tem tido dificuldade em repatriar capitais de Angola, fruto da falta de divisas na sequência da queda do preço do petróleo. No relatório e contas de 2014, a TAP explica tinha depósitos bancários no país no valor de 19,2 milhões de euros e que estava com “dificuldades de repatriamento de fundos”.

Foi por esse motivo que decidiu recorrer ao banco angolano BIC, com o qual negociou “uma linha de crédito corrente” para que a instituição disponibilize ao grupo “os montantes retidos em Angola, encontrando-se os depósitos bancários classificados como colateral do financiamento obtido”. Além disso, a TAP explica que outra alternativa para resolver o problema tem passado por utilizar o dinheiro retido “no pagamento de gastos locais”. Questionada pelo PÚBLICO, a companhia também não respondeu às questões enviadas sobre o tema.

Menos dois milhões em Bissau
Porém, os constrangimentos que a TAP tem sentido em alguns mercados internacionais não ficam por aqui. O relatório e contas do grupo também revela que a companhia riscou do balanço quase dois milhões de euros com a liquidação do Banco Internacional da Guiné Bissau. No documento, a companhia descreve que os depósitos bancários existentes na instituição “foram considerados como não recuperáveis na sequência da dissolução e liquidação do banco”.

De acordo com o relatório, a TAP tinha cerca de 1,7 milhões de euros depositados na Guiné Bissau a 31 de Dezembro de 2014, o que representou um aumento substancial face aos 291 mil euros registados um ano antes. A transportadora aérea, que suspendeu as ligações ao país na sequência de um incidente de segurança que envolveu o embarque de 74 sírios, também não prestou esclarecimentos sobre este assunto.

A instabilidade sentida nestes mercados não foi benéfica para as contas da transportadora aérea nacional, que em 2014 registou prejuízos de 46,4 milhões de euros, depois de ter gerado lucros de 34 milhões um ano antes e sem que conseguisse aproveitar totalmente a queda do preço do petróleo. A derrapagem contribuiu negativamente para os resultados do grupo, cujos prejuízos atingiram 85,1 milhões no ano passado.

Outra geografia que tem dado dores de cabeça à TAP é o Brasil, que apesar da melhoria nas contas, ainda registou perdas de 22,6 milhões em 2014. O problema, porém, não é apenas o resultado líquido negativo. É que a M&E Brasil, uma unidade de manutenção que o grupo adquiriu à falida Varig em 2005, acumula pesadas contingências. Apesar de a TAP já ter conseguido eliminar as dívidas ao fisco e à Segurança Social brasileira, continua a provisionar mais de 23 milhões de euros para fazer face a processos judiciais em curso no país.

Dentro de um mês, os potenciais interessados na compra da companhia terão de apresentar ofertas vinculativas. O Governo pretende concluir a venda de 66% do capital da TAP até ao final de Junho.

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