Práticas restritivas do comércio: um diploma que terá vida curta

Este diploma terá, na sua actual versão, uma vida curta.

O novo regime das práticas individuais restritivas do comércio (RPIRC), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 166/2013, de 27 de Dezembro, entrou em vigor no passado dia 25 de Fevereiro. O RPIRC consubstancia uma alteração significativa do regime em vigor (o diploma, na sua última versão, era de 1993), impulsionada pelas recentes polémicas acerca das políticas de descontos praticadas por conhecidas cadeias de hipermercados.

Embora algumas das proibições estabelecidas no RPIRC venham de longe, a verdade é que as coimas aplicáveis eram de tal modo reduzidas, que grande parte dos operadores económicos ignorava o seu conteúdo, situação que agora se inverteu radicalmente, passando-se do “8” para o “80”.

Não se pode dizer que esta seja uma má iniciativa legislativa, mas a verdade é que determinadas regras do novo diploma são demasiado confusas e ambíguas, não se descortinando a vontade do legislador, sendo que, em determinadas matérias, chega a ser um exercício de pura “adivinha”. É manifesto que um regime jurídico com estas características não se coaduna com a necessária segurança jurídica que é exigível, antevendo-se um período de grande litigiosidade.

É meu entendimento que este diploma terá, na sua actual versão, uma vida curta.

Embora seja inegável a necessidade de introdução de determinadas regras que protejam certos produtores da posição desequilibrada em que se encontram em relação a grandes grupos retalhistas, a verdade é que o RPIRC se pode virar contra os mesmos. Na verdade, tendo em conta o âmbito de aplicação do RPIRC, é provável que um distribuidor português, para não ser abrangido pela proibição de venda com prejuízo, opte por adquirir os produtos a fornecedores internacionais, com claros prejuízos para os operadores nacionais, que assim verão as suas vendas reduzidas. Por outro lado, não será de menosprezar um possível aumento dos preços (com manifesto prejuízo para os consumidores), nomeadamente se produtores e distribuidores não se entenderem em relação às alterações contratuais que estão obrigados a efectuar.

Uma nota para o regime sancionatório. Embora se passe a distinguir as coimas aplicáveis tendo em conta um maior leque de destinatários (pessoa singular ou micro, pequena, média ou grande empresa), introduziu-se um enorme aumento dos valores mínimos e máximos, passando a coima máxima nas grandes empresas para 2,5 milhões de euros. É inegável que tais coimas passam a ter um caracter dissuasor que anteriormente não existia, mas também parece inquestionável que se colocam agora diversas questões, designadamente de constitucionalidade, nomeadamente tendo em conta os montantes das coimas, a enorme amplitude entre os valores mínimos e os valores máximos e a ausência de critérios para determinar a medida das mesmas, o que poderá levar à sua aplicação desproporcional e arbitrária.

Aguardemos os próximos capítulos nos Tribunais!

Advogado, Sócio na “Telles de Abreu e Associados – Sociedade de Advogados, RL

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