Portuguesas com certeza, mas de capital estrangeiro

Há várias empresas do sector agro-alimentar de origem nacional que já não são detidas por portugueses.

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A marca do queijo Limiano é detida pelo grupo Bel Rui Gaudêncio

O Queijo Limiano é detido por uma empresa de origem francesa. As bolachas Triunfo são de norte-americanos. A cerveja Sagres de holandeses. O Sonasol pertence a uma multinacional alemã. A lista poderia continuar. São marcas genuinamente portuguesas, destinadas ao mercado nacional, fundadas por empresários nacionais, com fábricas e trabalhadores nacionais. Mas cujo capital está nas mãos de estrangeiros.

O actual tecido industrial, sobretudo no sector dos bens de grande consumo, foi muito impulsionado por multinacionais com grandes portefólios que entraram em Portugal através de aquisições. A família alemã Henkel, por exemplo, chegou ao mercado nacional em 1989 com a compra da Sociedade Nacional de Sabões, que produzia o Sonasol, detergente líder do seu segmento. A norte do país, o famoso queijo Limiano - que até deu nome a um Orçamento do Estado – tem dono de origem francesa, o grupo Bel, que opera neste sector há 145 anos e tem mais de 25 marcas locais e 5 internacionais (incluindo A Vaca que Ri).

A subsidiária portuguesa é fruto da fusão entre a Lacto Lusa, a Lacto Lima, a Lacto Açoreana, Agrolactea e a Lacticínios Loreto. O ano passado facturou 118 milhões de euros, tem uma quota de 35% do mercado de queijo flamengo (em volume) e investiu, recentemente, três milhões de euros nas três fábricas em Vale de Cambra, Ribeira Grande e Covoada, as duas últimas nos Açores. O mercado português vale cerca de 5% do volume de negócios do grupo, adianta Paula Gomes, directora de marketing da Bel Portugal, que também produz o Terra Nostra e emprega 600 trabalhadores.

“O facto de contarmos com produção nacional é algo que consideramos uma mais-valia para manter essa ‘portugalidade’”, defende, acrescentando que os investimentos no aumento da capacidade de produção têm como alvo as exportações. Em três anos o objectivo é pesarem 10% das vendas nacionais. Paula Gomes sublinha ainda que o consumidor “não faz uma ligação clara entre a marca e a nacionalidade do capital da empresa, mas sim uma ligação entre a marca e a origem do produto”. Quer o Limiano quer o Terra Nostra, são produzidos em Portugal.

Se há empresa experiente na mudança de donos é a Triunfo, que completa 100 anos em 2013. Fundada por um grupo de empresários de Coimbra em 1913, esteve nas mãos da holding pública IPE e foi comprada nos anos 1990 pelo grupo de Jorge de Mello. A Nutrinveste, holdingdo sector agro-industrial do grupo (dono do azeite Oliveira da Serra), encerrou a emblemática fábrica de Coimbra – ainda hoje abandonada - e concentrou a produção em Mem Martins. Contudo, em 2004, vendeu a unidade e a marca de bolachas à United Biscuits (UB), de origem britânica. Foi o início de uma era de gestão e capital estrangeiros.

Dois anos depois, a gigante Kraft Foods (que detém o queijo Philadelphiae as Oreo) compra a marca portuguesa no âmbito da aquisição do negócio Ibérico da UB. E, em 2011, a multinacional decidiu separar os seus negócios de bolachas, snacks e guloseimas da área de alimentação e bebidas. A Mondelez International é, agora, a dona da portuguesa Triunfo.

Rodrigo Carmona, director de marketing da categoria de bolachas da Mondelez em Portugal, explica ao PÚBLICO que no portefólio da empresa americana a Triunfo “assume um papel determinante, pois é uma marca portuguesa com grande história e relevância no mercado, e com a qual os consumidores têm uma grande ligação”. As várias fases e aquisições de que foi alvo “foram fundamentais para que 100 anos depois continuasse a ser uma marca de sucesso”, defende, acrescentando que a essência nacional se mantém.

Na fábrica de Mem Martins, que a empresa veda aos olhares dos jornalistas, são produzidas as bolachas Maria, Torrada, Mariachoc, Maria Soja, Belgas ou Shortcake. De acordo com Rodrigo Carmona, a Triunfo fechou 2012 com uma quota de 8,7% em valor. Na extensa lista de produtos, a Mondelez tem ainda a portuguesa Proalimentar, as pastilhas Tridente ou as gelatinas Royal. Emprega 160 trabalhadores.
 
 

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