Pires de Lima já “perdeu as ilusões” sobre a PT como “matriz de uma fusão luso brasileira”

O ministro da Economia quer “separar o trigo do joio” porque entende que nem o BES nem a PT representam a realidade empresarial portuguesa, e critica o que considera ter sido a “destruição de valor” na operadora nos últimos anos.

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Ministro da Economia diz que a “exposição dos casos BES e PT” pode ser “uma oportunidade para mudar alguns maus hábitos” Pedro Cunha

Quando os gestores da PT e da Oi anunciaram a fusão entre as duas companhias, a tónica foi posta na criação de um grande operador internacional de língua portuguesa, alimentado com a excelência tecnológica da PT e com capacidade de crescimento via Brasil. Passado um ano, e com o caso da aplicação de 900 milhões de euros em papel comercial da Rioforte pelo meio, a Oi tem os activos da PT, mas os accionistas da PT já só têm 25% da Oi. E a ideia de uma fusão entre iguais parece ter caído por terra. “Por muito relevante” que seja a empresa do ponto de vista tecnológico, “a ilusão da PT como matriz de uma fusão luso-brasileira e campeã nacional, já a perdi há muito”, disse ao PÚBLICO o ministro da Economia, António Pires de Lima.

Foi num tom bastante crítico que o governante se referiu às “situações inexplicáveis” do BES e da PT, sublinhando que é necessário “separar o trigo do joio”, porque nenhuma destas empresas “representa o mercado de capitais [português] como um todo”, nem a “gestão qualificada e séria que existe nas empresas portuguesas”.

Apesar de reconhecer o “indiscutível impacto destas situações na reputação” das empresas nacionais e no “esforço grande que tem sido feito de atracção de investimento para Portugal”, o ministro também encontra motivos de optimismo na turbulência dos últimos tempos. Se a queda da bolsa pode ser uma janela para a entrada de novos investidores nas empresas, a “exposição dos casos BES e PT” pode ser “uma oportunidade para mudar alguns maus hábitos”. São exemplos as “gestões glorificadas que, ano após ano, o que fazem é destruir valor” e as situações em que “os interesses dos accionistas são capturados pelos interesses dos gestores”. “A PT hoje vale 15% do que valia há meia dúzia de anos, ninguém pode ter ilusões sobre aquilo que se passou em termos de destruição de valor”, afirmou.

E referindo-se em particular à aplicação de 900 milhões de euros da PT na Rioforte, Pires de Lima disse tratarem-se de “actos de gestão que não têm explicação possível no domínio da gestão”.

Uma opinião corroborada pela comissão de trabalhadores da própria PT. Num comunicado divulgado terça-feira à noite, a comissão de trabalhadores (CT) criticou o empréstimo à Rioforte e exigiu que “todos os administradores envolvidos” na operação devolvam “os bónus anuais que receberam desde 2010, ou seja, desde a venda da participação da PT na Brasilcel à Telefónica, incluindo os bónus extraordinários”.

A CT sublinhou ainda que estes administradores “não têm condições para continuar a ser” administradores de “nenhuma empresa do universo PT”. Até à data, apenas Henrique Granadeiro (presidente) e Luís Pacheco de Melo (administrador financeiro) estão associados publicamente a esta decisão de investimento (ambos assinaram os documentos de esclarecimento ao mercado sobre as emissões de papel comercial). Luís Pacheco de Melo foi o único administrador a cessar funções executivas na PT Portugal, a empresa que transitou para a Oi com os activos do grupo. Três dos outros administradores executivos da PT Portugal, que são também administradores da PT SGPS, mantêm-se em funções, mas agora sob liderança de Armando Almeida. O gestor que vem da Nokia Siemens irá substituir em breve Zeinal Bava na liderança do negócio de telecomunicações português.

Bava, que é líder executivo da Oi há um ano, formalizou ontem a sua saída da PT Portugal e de todas as empresas do grupo PT onde tem cargos. O gestor, que assim se afasta do dia-a-dia da empresa e das polémicas que no último mês têm envolvido o Fórum Picoas (sede da PT SGPS), quer concentrar-se exclusivamente na Oi, que tem de ser “gerida como uma multinacional”, como disse à Reuters.

Além de mudanças na estrutura organizativa, a PT poderá estar também na iminência de alterações na estrutura accionista, sendo provável que o BES venha a vender a sua posição de cerca de 10% do capital da empresa. As expectativas estendem-se também à permanência da Ongoing (também com 10%) tendo em conta a sua dependência financeira do banco que pertenceu à família Espírito Santo.

Até ao momento, a PT ainda não explicou ao mercado qual o impacto negativo de deter 2,1% do "banco mau" do BES, e porque é que, e quando, levantou os depósitos de 128 milhões de euros que detinha no banco.

Prejuízos de 72 milhões de euros
Ontem, a Oi apresentou os resultados do segundo trimestre, os primeiros em que consolidou contas com a PT. É que embora a fusão ainda vá ter de ser votada pelos accionistas da PT, para que aprovem os novos termos do acordo com a Oi (que passam por uma diminuição da sua posição de 38% para 25,6% e pela assunção do risco relacionado com a dívida da Rioforte), para todos os efeitos as duas empresas já estão integradas devido ao aumento de capital que transferiu os negócios da PT (em Portugal e África) para o grupo brasileiro.

Em termos consolidados, a Oi (mais PT) apresentou prejuízos de 72 milhões de euros no segundo trimestre, o que a empresa explicou pelo facto de os resultados não serem comparáveis e os do primeiro trimestre terem sido positivamente influenciados por mais-valias de 400 milhões de euros que não se repetiram. No conjunto do semestre, os resultados caíram 95% para 2,3 milhões de euros e as receitas subiram 1,1%, para 5900 milhões de euros. O lucro antes de impostos, juros, amortizações e depreciações (EBITDA) subiu 8%, para 145 milhões de euros.

Olhando para Portugal, as receitas da PT subiram 9,5% em reais, a reflectir o impacto cambial, mas caíram 3,4% em euros, para 609 milhões de euros. O EBITDA melhorou para 256 milhões de euros, graças a menores custos.

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