"Subsídios na energia não devem ser para quem aquece a água da piscina"

Até 15 de Julho, a Comissão Europeia promete uma comunicação sobre como pretende dar mais poder aos consumidores de energia e uma proposta de reforma do comércio de emissões na União Europeia.

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Maros Sefcovic, vice-presidente da Comissão Europeia e coordenador da pasta da União da Energia REUTERS/Eric Vidal

Maros Sefcovic, vice-presidente da Comissão Europeia e coordenador da pasta da União da Energia, defende que os consumidores de energia devem ter “mais poder sobre as suas contas de energia com possibilidade de escolher a quem comprá-la e a que preço e um papel muito mais importante na concorrência”. Sefcovic está nesta quinta-feira em Lisboa para um diálogo com os cidadãos sobre a União da Energia.

Que impactos se podem antecipar de uma eventual saída da Grécia para a União da Energia? 
A União da Energia é um projecto benéfico para todos os países membros da União Europeia (UE) e ainda para países da comunidade energética dos Balcãs Ocidentais, Moldávia e Ucrânia. A Grécia está no cruzamento [de vários países]. A União da Energia é muito importante para a Grécia, como é para todos os Estados-membros. Acredito que este projecto vai em frente porque traz um sentido positivo aos Estados-membros e à comunidade de países de energia.

Quais são para Portugal, os benefícios e desafios da União da Energia?
Estou a fazer uma ronda pelos países da Europa a explicar o que é a União da Energia e incentivar o apoio público para este projecto porque não podemos construí-lo em Bruxelas, tem de ser em Portugal, em Espanha, na Eslováquia, nas nossas cidades, nas nossas aldeias, tem de ser aceite pela nossa indústria, pelas autoridades locais. Portugal tem um bom desempenho em relação à segurança do abastecimento, à diversificação do abastecimento de gás, também está bem nas metas de energia 2020, com perspectivas muito positivas para 2030. É impressionante que já em 2013 mais de 49% da electricidade consumida em Portugal tenha vindo de fontes renováveis. Estes dados são muito positivos e promissores para o futuro. Em relação às oportunidades, uma das prioridades é melhorar a capacidade de interligação da Península Ibérica. Precisamos disso. A ligação entre Portugal e Espanha está bem, mas a questão é depois a ligação com França e daí para a Europa. Também é positiva a revisão do plano nacional de energias renováveis com as estimativas, que partilhamos, de criação de 70 mil empregos directos e indirectos até 2020, ainda que vejamos alguns negócios em Portugal particularmente dependentes dos combustíveis fósseis. Uma das questões que vamos discutir com os ministros e também com os cidadãos de Portugal será a pobreza energética. Dez por cento dos europeus não conseguem pagar as suas contas de energia ou aquecer adequadamente as suas casas. É também um problema em Portugal, mais de 31% dos lares têm problemas de fugas e 27,6% têm dificuldade em manter uma temperatura adequada. No que se refere aos preços de energia e à pobreza energética, precisamos de soluções, por um lado, para melhorar os sinais de mercado e de pressão de mercado para que os preços desçam e, por outro, lidar com estes problemas dos cidadãos com instrumentos mais precisos.

Com toda a incerteza que rodeia neste momento o preço do carbono e os subsídios de energia, como é que os consumidores vão ter energia mais acessível, a preços mais baixos, como propõe a União da Energia? 
É verdade que um dos critérios de sucesso da União da Energia virá da forma como lidarmos com os preços. A indústria queixa-se que tem preços muito altos e que isso afecta a sua competitividade na concorrência global e, por outro lado, vemos que um significativo número de cidadãos europeus tem problemas em pagar as suas contas de energia. Queremos actuar em diversas frentes: completar o Mercado Interno de Energia, ter a possibilidade real de uma livre circulação de energia e uma concorrência acrescida de mercados também ajudará a descer os preços. Ao mesmo tempo, queremos dar mais poder aos consumidores. Vamos publicar dentro de alguns dias uma comunicação sobre esta questão. Queremos que os consumidores tenham mais poder sobre as suas contas de energia com possibilidade de escolher a quem comprá-la e a que preço e tenham um papel muito mais importante na concorrência, permitindo uma decisão mais informada. No que toca à pobreza energética, devemos tratar esta questão mais como uma questão social, o que significa que nem todos devem beneficiar de subsídios mas apenas aqueles que precisam realmente. Os subsídios devem ir para quem tem pequenos apartamentos, não para quem aquece a água da piscina. Não será difícil fazer isso. Vamos precisar de uma abordagem diferenciada que permita aos mercados perceberem uma descida de preços e até lá ajudar os cidadãos vulneráveis.

Como é que a União da Energia aponta para uma Europa mais limpa quando o consumo de carvão cresce na mesma Europa? 
É verdade que vemos hoje em alguns países da UE elevados investimentos em renováveis e redução de fósseis e em outros o carvão, que se tornou tão barato, é atractivo de novo. A razão de fundo é que o sistema de comércio de emissões da UE não está a funcionar como deveria, o preço do carbono de hoje é pouco mais de sete euros por tonelada, demasiado baixo para impulsionar a inovação ou para motivar as companhias a emissões de CO2 mais amigas do ambiente. Por isso, vamos apresentar a nossa proposta de reforma do comércio de emissões no dia 15 de Julho. Já temos um acordo com os Estados-membros e com o Parlamento para diferir 900 milhões de licenças [para 2019-2020]. Acredito que vamos ver o preço de mercado do carbono determinado pelo mercado e que os sinais correctos serão transmitidos à economia, em termos de investimento e de evolução das emissões.

O plano da União da Energia, ao nível da sua governação, previa uma única voz europeia para a compra de energia, nomeadamente gás natural, bem como um regulador europeu de energia. Tem havido uma forte oposição nomeadamente da Alemanha em relação ao primeiro ponto. O que vai acontecer?
No que se refere a falar a uma voz e a uma diplomacia energética mais forte, esta ideia tem um forte apoio dos estados-membros. Na semana passada, participei no primeiro debate de diplomacia da energia alguma vez feito, segundo me foi dito, com ministros dos Negócios Estrangeiros. Podem ter diferentes posições de partida, mas, no geral, perceberam os aspectos sensíveis da segurança que se colocam nas conversações de energia e a clara preferência para a Europa falar a uma voz. Segundo aspecto, é ter uma ferramenta especial, um acordo intergovernamental para os contratos comerciais de gás natural, onde queremos usar o máximo possível de poder de transparência. Queremos que os contratos sejam compatíveis com a lei europeia e gostaríamos muito de usar o nosso poder, enquanto maior importador de energia do mundo, para ter a certeza de que as nossas empresas podem partilhar mais informação sobre preços de energia, ter informação mais transparente. Acreditamos que podemos dar mais poder às empresas para negociarem melhores contratos.

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