O G20 e o debate sobre as dívidas soberanas

Sobressai o silêncio daquelas economias que vêem com preocupação a forma como crescem as suas dívidas públicas e como diminui o grau de sustentabilidade das mesmas.

O Grupo dos 20 uniu a sua voz no passado fim-de-semana a favor do debate e da solução para o vazio legal que envolve na actualidade os processos de reestruturação da dívida soberana.

Na sua declaração final, após a cimeira realizada na Austrália, o G20 festejou os progressos alcançados nos últimos meses e destacou a importância de se encontrar uma solução para construir um sistema financeiro mais sólido e estável que seja um instrumento de crescimento e desenvolvimento sustentável.

As gestões realizadas pela Argentina para abrir este debate a nível global somam assim, em apenas um par de meses, um terceiro acontecimento de relevância em instâncias multilaterais. Após a resolução aprovada pela esmagadora maioria dos países em desenvolvimento na Assembleia das Nações Unidas e as declarações realizadas pelo Fundo Monetário Internacional, são agora as maiores economias do mundo as que destacam a necessidade de incluir esta problemática na sua agenda de reformas para o sistema financeiro global.

O êxito dos esforços da Argentina para estabelecer o tema das reestruturações da dívida soberana dentro da agenda económica e financeira global é um reflexo da perplexidade com que a comunidade internacional observa os abusos dos quais o meu país é hoje vítima.

Nem a abertura do debate nem a concretização de reformas concretas resolverão a situação actual na qual se encontra a Argentina, que enfrenta o boicote a uma renegociação de dívida realizada há dez anos e aceite por mais de 93% dos seus credores. No entanto, evitar que este tipo de abusos volte a repetir-se parece ser o único caminho possível para construir um sistema financeiro global mais justo e evitar a impunidade com que operam actualmente alguns fundos especulativos.

Embora não haja um consenso sobre a melhor forma de resolver a questão, a declaração do G20 cristaliza a vocação da maioria para procurar uma solução para este problema.

O debate da actualidade é organizado à volta de duas posições. As potências mundiais manifestaram-se a favor de discutir e criar novas cláusulas para serem incorporadas em futuras emissões de dívida. Enquanto isso, um grupo de 124 países emergentes destacou a existência de um stock de mais de 900 bilhões de dólares de dívida em risco e a possibilidade de interpretações judiciais caprichosas como a que afecta hoje a Argentina, que requerem a criação de uma instância multilateral para regular a reestruturação.

O debate já começou e os diversos protagonistas colocaram sobre a mesa as suas diferenças. Enquanto isso, sobressai o silêncio daquelas economias que vêem com preocupação a forma como crescem as suas dívidas públicas e como diminui o grau de sustentabilidade das mesmas. O temor de que uma posição em relação a estes temas implique um "castigo do mercado" que agrave as suas circunstâncias económicas é claramente mais uma prova da necessidade de reformas do actual sistema financeiro.

Esperemos que a unanimidade alcançada sobre a necessidade de um debate abra caminho para a participação destes países cuja voz é fundamental nos debates que, felizmente, começam a realizar-se.

Embaixador da Argentina em Portugal

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