Multas sobem e contratos com fornecedores têm novas regras

Novo diploma tende para a protecção dos fornecedores contra práticas unilaterais

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Descontos terão de ser previstos em contratos escritos Fernando Veludo

A nova lei que regula as práticas restritivas do comércio vai substituir um diploma com 20 anos, criado numa altura em que o "comércio moderno" estava a anos-luz do actual paradigma.

 

"Quando foi tipificada em 1993, a lei baseava-se sobretudo na ideia da concorrência entre a grande distribuição", diz João Cruz Ribeiro, advogado que acompanha casos de venda com prejuízo. "Um operador, ao começar a praticar preços abaixo do preço de compra, destrói a concorrência."

O crescimento do sector – traduzido em cada vez mais espaços comerciais, insígnias, trabalhadores e facturação – foi "abissal" nos últimos 20 anos. E as preocupações com as vendas abaixo do preço de custo alargaram-se aos fornecedores, hoje pressionados pelos aumentos dos custos de produção e pela queda do consumo.

A tensão negocial entre distribuição e produtores é uma constante, quase faz parte do negócio. Mas quando a crise reduz vendas, a pressão para reduzir custos aumenta em todos os elos da cadeia. Depois das promoções do início de 2012, a ministra da Agricultura, Assunção Cristas, do CDS-PP, anunciou alterações na lei para regulamentar a relação entre as partes.

Cristas criou a Plataforma de Acompanhamento das Relações na Cadeia Agro-Alimentar (PARCA), que juntou à mesma mesa os representantes da agricultura, indústria agro-alimentar, pequeno comércio e grande distribuição. Após meses de reuniões, propôs novos regimes jurídicos, em conjunto com o Ministério da Economia.

O primeiro a ser publicado em Diário da República diz respeito à redução dos prazos de pagamento aos pequenos fornecedores, organizações de produtores, cooperativas e empresas da fileira do pescado, que passam de 60 para 30 dias.

O Governo elaborou, depois, uma proposta de lei sobre o novo regime das práticas restritivas do comércio, que incluem não só as vendas com prejuízo, mas também a recusa de venda de bens e serviços, aplicação de preços ou condições de venda discriminatórias ou práticas negociais abusivas.

A nível europeu, o assunto também está em cima da mesa. Na passada semana, a Comissão Europeia lançou uma consulta pública sobre práticas comerciais "desleais", que permitirá a Bruxelas recolher dados sobre os efeitos destas infracções na economia.

Multas 83 vezes mais altas

A nova proposta do Governo altera os valores das multas cobradas por vendas abaixo do preço de custo. Os montantes máximos são 83 vezes superiores aos da actual regulamentação e passam, agora, para 2,5 milhões de euros nas contra-ordenações de grandes empresas. Quanto mais pequena for a empresa que cometer a infracção, menos paga: os micronegócios incorrem numa multa máxima de 50 mil euros.

Devido aos valores em causa, o Governo teve de pedir uma autorização legislativa à Assembleia da República. Num esclarecimento enviado ao PÚBLICO, fonte do Ministério da Agricultura diz que a proposta terá de ser discutida na Comissão de Economia e Obras Públicas, passar pela "audição das entidades que venham a ser consultadas" e pela aprovação em plenário.

Além do aumento das multas, este diploma transfere para a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) o controlo de todo o processo de instrução das multas que, actualmente, é responsabilidade da Autoridade da Concorrência.

Mas é na regulação das relações entre fornecedores e vendedores finais que a nova lei se distingue. O advogado João Cruz Ribeiro sublinha que neste novo diploma há uma nova tendência "para a protecção dos fornecedores contra práticas unilaterais". Com a nova lei, qualquer desconto ou promoção terá de passar a estar firmado em contrato.

 
 
 

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