Atlantic Gateway diz que controlo de Pedrosa e Neeleman na TAP não é ilegal

O consórcio que quer comprar a transportadora admite que haverá controlo dos dois empresários, mas garante que isso não fere a lei europeia de serviços aéreos.

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Humberto Pedrosa e David Neeleman, os empresários que querem comprar a TAP Rui Gaudêncio

A lei europeia diz que uma companhia aérea só pode ter licença de actividade se for detida em mais de 50% do capital por um Estado-membro ou por um cidadão comunitário. Além de detida, tem também de ser “efectivamente controlada” por Estados ou cidadãos europeus. O empresário Humberto Pedrosa tem 51% do consórcio Atlantic Gateway que quer comprar a TAP, mas a questão chave está em saber quem controlará efectivamente a companhia, ou seja, quem terá o poder de tomar decisões uma vez privatizada. Sobre esse ponto fundamental as opiniões divergem e o próprio consórcio reconhece que Pedrosa não terá o controlo exclusivo da TAP, embora assegure que isso não infringe a lei.

“A notificante admite que, exclusivamente para efeitos de controlo de concentrações (…), as suas accionistas HPGB e DGN adquirem o controlo da TAP SGPS”, lê-se na notificação da operação à Autoridade da Concorrência (AdC), a que o PÚBLICO teve acesso. No entendimento dos advogados do consórcio, a avaliação do controlo da companhia para efeitos da lei da concorrência é diferente da avaliação do controlo atendendo à legislação comunitária sobre serviços aéreos.

Por isso, porque é uma “prática assente” da Comissão Europeia fazer a distinção entre “o conceito de controlo” para análise de concentrações e para cumprimento dos regulamentos europeus em diversos sectores (como o dos serviços aéreos), asseguram que “estão preenchidos todos os requisitos de propriedade e controlo” previstos na lei para que a TAP possa obter a sua licença de actividade.

Opinião distinta tem o candidato derrotado na privatização, Germán Efromovich, e a Associação Peço a Palavra (ligada ao movimento Não TAP os Olhos), que entendem que o consórcio é ilegal e que o negócio não pode ser feito. O primeiro diz que haverá um controlo conjunto da TAP, enquanto a associação argumenta que David Neeleman (com 49% do capital) terá controlo exclusivo, pois tem acções que lhe garantem mais poder, tem de realizar 95% do investimento e vai recolher 75% dos lucros.

Esclarecer se a lei está a ser cumprida na privatização é neste momento a missão principal da Autoridade Nacional da Aviação Civil (ANAC), liderada por Luís Ribeiro, nomeado em Julho pelo Governo. Está nas mãos da ANAC decidir se o negócio avança e, para isso, a questão do controlo efectivo deve ficar clarificada.

Na notificação à AdC, os advogados da Atlantic Gateway atalham que, “na hipótese de a AdC vir a considerar que há controlo conjunto na transacção em objecto, tal facto terá relevância apenas para efeitos da Lei da Concorrência” e não para a avaliação da legalidade do consórcio que quer comprar 61% do capital da TAP.

Foi esse precisamente o entendimento da entidade presidida por António Ferreira Gomes que, tal como o PÚBLICO noticiou, emitiu um parecer prévio de aprovação da operação por considerar que não cria entraves à concorrência. A AdC concluiu ainda  que o negócio visa a aquisição de “controlo conjunto da TAP por parte da HPGB [sociedade de Pedrosa] e da DGN [sociedade de David Neeleman]”. Embora salvaguarde que a sua análise se destina a avaliar o impacto concorrencial da compra da TAP (que registou prejuízos 110 milhões de euros no primeiro semestre, segundo um relatório de gestão citado pela Lusa), o regulador deixa claro que Pedrosa ficará dependente de Neeleman para tomar decisões estratégicas, mesmo tendo maioria do capital (51%).

São várias as matérias em que o dono do grupo Barraqueiro não poderá decidir sozinho, como por exemplo a distribuição de dividendos, a concessão e reembolso de prestações acessórias, a venda de activos, a contratação de empréstimos ou a nomeação de novos administradores.

Uma vez que Pedrosa e Neeleman (dono da transportadora aérea brasileira Azul) vão eleger conjuntamente todos os órgãos sociais da TAP SGPS e das suas subsidiárias, a AdC também cita a Comissão no seu parecer quando diz que o “poder de determinação conjunta da estrutura dos órgãos de gestão (…) confere em geral ao seu detentor [do direito de veto ou de oposição] o poder de exercer uma influência decisiva sobre a política comercial de uma empresa”.

Mas, tendo em conta a posição do consórcio e dos assessores do Governo que consideram válida a candidatura da Atlantic Gateway, esta “influência decisiva” é relevante apenas para efeitos da lei da concorrência e não colide com as regras europeias.

Um dos elementos em que Germán Efromovich (que foi afastado de uma anterior tentativa de privatização, em 2012, por ter falhado a entrega de garantias bancárias) suporta a sua contestação à legalidade do consórcio vencedor é um parecer de professores de Direito da Universidade de Coimbra em que se sublinha que os requisitos de “propriedade” e “controlo” previstos na lei europeia sobre serviços aéreos têm de ser ambos cumpridos e que o primeiro (da propriedade) não corresponde, nem se esgota no segundo (do controlo).

Ou seja, saber quem é o proprietário da maioria do capital da empresa não é o mesmo que saber a quem cabe a sua gestão e as decisões estratégicas. Estes dois requisitos previstos na lei europeia visam garantir, por um lado, que o benefício económico ligado à propriedade permanece na União Europeia e, por outro, que o poder de gestão numa empresa num sector económico relevante como a aviação se mantém em linha com os interesses europeus, salientam os professores.

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