ASAE fiscaliza 77 supermercados e instaura 15 processos por más práticas no comércio

Cinco meses depois da entrada em vigor da nova lei das promoções, a autoridade analisa 15 multas e detecta 28 infracções

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Nova lei foi precipitada pela campanha do 1º de Maio do Pingo Doce DR

Cerca de cinco meses depois da entrada em vigor da lei que regula as más práticas no comércio, a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) já instaurou 15 processos de contra-ordenação e detectou 28 infracções em acções de fiscalização.

De acordo com dados fornecidos pelo Ministério da Economia, que tutela a ASAE, entre Abril e 4 de Julho foram fiscalizados 77 operadores económicos no âmbito da aplicação das novas regras, conhecidas como as PIRC (Práticas Individuais Restritivas do Comércio). Os 15 processos de contra-ordenação estão em fase de instrução e, a confirmarem-se os crimes de venda abaixo do preço de custo, as lojas fiscalizadas arriscam-se a uma coima que pode chegar aos 2,5 milhões de euros. Se a infracção for cometida por uma pequena empresa o valor da coima situa-se entre os 2500 euros e os 50 mil euros. Recorde-se que o diploma deu novas competências à ASAE que passou a instruir os processos, uma tarefa até agora feita pela Autoridade da Concorrência (AcC).

A lei tem dado dores de cabeça às cadeias de distribuição e aos fornecedores, e já obrigou a própria ASAE a redigir um esclarecimento com perguntas e respostas que teve, entretanto, uma segunda versão. Uma das consequências da nova lei, antecipada quer pelas empresas, quer por juristas, é o aumento do litígio nos tribunais já que têm sido várias as interpretações que o diploma suscita.

Uma das infracções que mereceu maior atenção na actualização da lei é a venda abaixo do preço de custo que, apesar de já estar regulada no anterior diploma, abrange novos tipos de desconto. Estas reduções de preço, como os descontos em cartão, passam a contribuir para a formação do preço de compra, aspecto essencial para detectar se houve ou não venda com prejuízo.

Em respostas enviadas por e-mail, a ASAE sublinha que o novo regime jurídico “pretende assegurar a transparência e o equilíbrio nas relações comerciais e posições negociais entre agentes económicos, visando uma ajustada concorrência entre as empresas”. Assim, a autoridade tem feito “desde Abril várias acções de fiscalização de forma a assegurar a fiscalização do cumprimento do diploma vigente”. Em Abril, foram visitados 27 supermercados e entre Maior e até 4 de Julho, outros 50. Nestas acções foram envolvidas 19 brigadas.

A ASAE herdou, no total, 50 processos que estavam pendentes na AdC. Com novas responsabilidades, a entidade criou três brigadas especializadas em cada unidade regional. A instrução de processos é feita por uma equipa que depende da estrutura central e teve formação, dada pelo regulador da concorrência.

Distribuição reuniu com Governo
Ana Isabel Trigo de Morais, directora-geral da Associação Portuguesa das Empresas de Distribuição, confirma que houve um reforço da inspecção “no que toca ao regime de vendas com prejuízo”. Quanto às contra-ordenações e infracções, Ana Isabel Trigo de Morais diz que “as empresas que foram alvo [dos processos] estão a colaborar e a responder”. A APED diz que ainda é cedo para fazer balanços da aplicação do diploma e que os agentes económicos ainda se estão a adaptar. “Prova disso foi a necessidades de a ASAE ter de publicar um guia interpretativo da lei, que já teve duas versões”, sustenta.

Contudo, a directora-geral da associação, que representa desde hipermercados a grandes cadeias de retalho, lembra que um dos primeiros resultados práticos “é a confusão jurídica que se gerou à volta da aplicação da lei”. “É inédita a discussão que se gerou cobre como se cumpre a lei”, afirma.

As preocupações e dúvidas do sector já chegaram ao Governo, que tem mantido a posição de não alterar ou avançar para esclarecimentos sobre o diploma. A APED foi recebida pelo Ministro da Economia, António Pires de Lima, e encontrou “um clima de grande abertura”.

Pedro Pimentel, director-geral da Centromarca, Associação de Empresas de Produtos de Marca - que sempre defendeu a nova lei - diz que apesar da presença regular das autoridades, não se gerou “alarido ou tensão excessiva”. A associação também diz que é cedo para conclusões mas, depois de um período inicial de adaptação, fornecedores e distribuidores “vão incorporando os novos conceitos”. Há mesmo “um cuidado acrescido” na negociação entre as partes “e, ao contrário do que foi amplamente veiculado”, a nova legislação não inibiu “a actividade promocional nem penalizou os preços ao consumidor”. Pedro Pimental sublinha que os dados mais recentes mostram que houve até um crescimento nos “três últimos meses” das compras em promoção.

A nova lei defende a auto-regulação e prevê a elaboração de um Código de Boas Práticas, que seja subscrito pelos fornecedores e pela distribuição. Contudo, não houve qualquer evolução nesta matéria. A Centromarca diz que este compromisso “deverá ser uma realidade a curto/médio prazo”. “Quando for acordado, será um factor mais de melhoria do relacionamento no seio da cadeia de abastecimento, contribuindo também para um melhor cumprimento da lei”, defende Pedro Pimentel.

Consequências do 1º de Maio
A nova lei das práticas restritivas do comércio foi precipitada pela promoção do 1º de Maio de 2012 do Pingo Doce, que lançou uma campanha inesperada de 50% de desconto em quase todos os produtos. A Autoridade da Concorrência condenou a cadeia de supermercados do grupo Jerónimo Martins a uma coima de 29.927,88 euros, a que se somaram 250 euros por custas com o processo, por vender abaixo do preço de custo. Em causa estavam 15 contra-ordenações. Mais tarde, o Tribunal da Concorrência decidiu reduzir para menos de metade a multa máxima aplicada pelo regulador e das 15 infracções identificadas sobrou apenas uma.

Num outro caso de vendas com prejuízo, que surgiu com a apreensão de leite pela ASAE no Continente e no Modelo Continente, também em 2012, o tribunal manteve a acusação, mas baixou a coima de 7793 euros para 6500 euros. Já o Continente terá de pagar os 29.927,88 euros que o regulador tinha aplicado. Todas as decisões judiciais foram objecto de recurso.

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