As caras adoradas

Cada vez é mais barato comprar os cada vez mais poderosos computadores de bolso a que chamamos injustamente telemóveis.

Uma pessoa habitua-se a ter as caras adoradas no bolso. Não são só fotografias. São filmes com as vozes adoradas a falar, vez após vez, as vezes que se quiser.

O WhatsApp é muito bom. Anda-se de um lado para o outro com um arquivo que outrora ocuparia uma estante que agora cabe no telemóvel. Todas os mails estão lá. Há bibliotecas e revistas, jornais e a Internet, fotografias para tirar, filmes para fazer. Há um gravador para apontamentos.

Não é um milagre. É um conseguimento humano. Não tem nada que ver com esta ou aquela marca ou este ou aquele aparelho. Só começou há pouco tempo, mas é tal o êxito dos smartphones que parece que sempre tivemos um. Cada vez é mais barato comprar os cada vez mais poderosos computadores de bolso a que chamamos injustamente telemóveis.

O avanço tecnológico não é suficientemente celebrado. Ficámos blasés. Dizemos que os novos modelos são iguais aos anteriores, fora este ou aquele pormenor. É mentira. Compare-se os de 2017 com os de 2012 e as diferenças tornam-se evidentes.

Dir-se-á que “eu não preciso de tanto poder computacional”. Podemos não precisar — mas usamo-lo à mesma. Nem reparamos na rapidez com que funciona, nem nos lembramos da lentidão insuportável dos modelos antigos que nós na altura aturávamos só por ser novidade.

Indo buscar as caras adoradas, para vê-las e ouvi-las a rir-se mais uma vez, esquecemo-nos do aparelho que seguramos. Desaparece no prazer de matar uma saudade. Usámos aquela máquina complicada para a apagar da nossa vista.

Sugerir correcção
Ler 4 comentários