A divulgação dos dados preliminares do Censos 2021 trouxe algumas notas de preocupação. Metade dos portugueses vive em 31 municípios, e nas duas áreas metropolitanas, o centro (Lisboa e Porto)  perdeu habitantes para as periferias. O tema pode parecer estranho a uma newsletter de Ambiente, mas as implicações destes dados na sustentabilidade dos nossos territórios urbanos e rurais justificam a chamada de atenção. Esta litoralização coloca-nos problemas de mobilidade e de pressão construtiva sobre as cidades que não podem ser resolvidos com a transformação de filas de carros a gasóleo em filas de carros eléctricos, e, por outro lado, aumenta ainda mais os riscos associados ao despovoamento do interior.

O presidente do IPMA diz-nos que Portugal tem de preparar-se para cenários francamente maus. No interior isso significa apostar cada vez mais actividades menos consumidoras de água e plantar espécies mais bem adaptadas ao aumento da temperatura (com incêndios), por exemplo. No litoral, isso implica o repensar de toda uma forma de urbanização que impermeabiliza solos e desdenha as soluções de base natural para lidar, por exemplo, com as inundações e enxurradas como as que temos visto noutros países (e que já tivemos na Madeira, lembra-se?). E lidar, neste caso, significa minimizar as consequências, porque o impacto será sempre duro.

O despovoamento do interior, mesmo com a beleza com que nos é mostrada por Tiago Fonseca (foto acima), é sempre uma má notícia para quem mantém ligações a territórios onde restam cada vez menos pessoas. Mas tem uma contrapartida relevante que nos custa, aos humanos, assumir. A rarefacção da nossa presença abre espaço à instalação, ou regresso, de outras espécies, como o urso pardo que se tem aproximado da nossa fronteira Norte, ou o lobo ibérico, cuja presença foi recentemente assinalada pela Quercus na região de Castelo Branco, de onde desaparecera há décadas. Com o tempo, talvez o país ganhe novos espaços para a conservação da natureza e da biodiversidade, que serão sempre um activo, pelos serviços de ecossistemas que prestam. Com a economia a aprender, finalmente, o que isso significa, talvez a expressão riquezas naturais ganhe outro significado.

Voltamos de hoje a quinze dias, com os Pés na Terra. Até lá, sugiro-lhe estas leituras mais, na expectativa de dias amenos: